O governo quer fazer do Brasil o quarto maior produtor de petróleo do mundo, levando a produção atual de 3 milhões de barris diários para 5,4 milhões em 2029, com 80% desse volume oriundo do pré-sal. Para isso, articula medidas de estímulo ao setor. Na próxima reunião do CNPE, ainda sem data definida, deve ser lançado o programa Potencializa E&P (sigla para exploração e produção), voltado para a atração de investimentos em óleo e gás natural.
Um dos focos do programa é o potencial da Margem Equatorial, nova fronteira exploratória brasileira em águas profundas e ultraprofundas, que fica no litoral entre os Estados do Amapá e Rio Grande do Norte. Outro é a promoção do desenvolvimento regional, fomentando produtores independentes, que costumam se interessar por campos maduros ou de economicidade marginal.
A Petrobras pretende investir na região cerca de US$ 3 bilhões entre 2023 e 2027. A ideia é perfurar 16 poços, mas a atividade depende de licenças ambientais. O plano estratégico da empresa para os próximos cinco anos foi aprovado em novembro de 2022 e soma US$ 78 bilhões em investimentos. Deste montante, 83% irão para exploração e produção, com foco no pré-sal. O segmento ainda terá US$ 20 bilhões em novos afretamentos de plataformas.
“As petroleiras apresentaram lucros extraordinários em 2022, em consequência do conflito na Ucrânia, que jogou os preços da energia nas alturas”, diz Marcelo Fonseca, sócio da HLB Brasil. Para ele, as empresas de petróleo seguirão com seus investimentos por vários motivos. O declínio natural dos campos, que exige esforços para ao menos manter o nível atual de oferta, é um deles. Outro é para compensar os baixos volumes de aporte dos últimos anos. “Isso tendo em vista o novo quadro energético imposto pela guerra”, afirma.
Já Walter de Vitto, analista de óleo e gás da Tendências Consultoria, aponta que a elevação dos riscos geopolíticos, somada à crescente demanda por combustíveis renováveis, eleva a cautela. Assim, ele acredita que a prioridade é aumentar a rentabilidade e reduzir os riscos. “Apenas investimentos em áreas em que o retorno é mais certo tendem a se concretizar”.
Para o analista, 2023 será um ano de ajustes para o setor. Isso porque o rearranjo dos fluxos globais, a retirada de estímulos fiscais e o aperto monetário global para domar a inflação, com destaque para os Estados Unidos, completam um quadro de menor pressão sobre os preços do petróleo em relação a 2022. Segundo Vitto, a retomada da economia na China e os cortes de oferta da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), a exemplo do que foi anunciado no começo de abril, poderão servir de atenuantes a uma queda mais expressiva nas cotações do barril.
Em meio ao debate e iniciativas sobre descarbonização, petroleiras presentes no país seguem com seus projetos fósseis. A anglo-holandesa Shell produz no Brasil cerca de 400 mil barris diários e exporta toda a sua produção. Em janeiro, decidiu, com os sócios TotalEnergies e Repsol Sinopec, fazer um investimento conjunto de cerca de US$ 1 bilhão no projeto Sudoeste de Lapa, na bacia de Santos.
“Prevemos o início da produção para 2025”, diz o vice-presidente de relações corporativas da Shell, Flavio Rodrigues. Em 2023, há avanços em algumas frentes: uma é a campanha de perfuração no bloco C-M-659, na bacia de Campos. Outra é o início da operação da usina termelétrica de Marlim Azul, em Macaé (RJ), no segundo semestre. “Vamos fornecer gás natural do pré-sal para a unidade, comercializando a energia tanto no mercado cativo quanto no mercado livre.”
A capacidade de Marlim Azul é de 565 MW e o empreendimento é uma joint-venture entre Pátria Investimentos, Shell e Mitsubishi Hitachi Power Systems. A Shell, diz Rodrigues, também tem acordos de suprimento de gás natural por meio da Shell Energy Brasil. Ele salienta que a guerra na Ucrânia mudou o debate sobre combustíveis: antes a preocupação principal era com o ritmo da transição energética. “Agora passou a ser a segurança energética global, além dos impactos causados pelo desequilíbrio entre oferta e demanda. Governos que buscavam uma redução ativa nos investimentos em petróleo e gás natural foram obrigados a reconsiderar suas posições”.
A norueguesa Equinor é outra multinacional com programa de investimentos no Brasil. São US$ 26 bilhões entre 2009 e 2030, com mais da metade aportada. Entre os projetos mais relevantes, há o campo de Bacalhau, na bacia de Santos, e o BM-C-33, na bacia de Campos.
“Na fase 1 de Bacalhau, serão investidos cerca de US$ 8 bilhões pela companhia junto com os parceiros”, diz a presidente da petroleira no Brasil, Verônica Coelho. Bacalhau terá um FPSO com capacidade para 220 mil barris diários, com previsão do primeiro óleo em 2025. Já o BM-C-33 está às vésperas de uma decisão final de investimentos. O campo tem estimativa, segundo ela, de escoar 16 milhões de metros cúbicos de gás ompanhia junto com os parceiros”, diz a presidente da petroleira no Brasil, Verônica Coelho. Bacalhau terá um FPSO com capacidade para 220 mil barris diários, com previsão do primeiro óleo em 2025. Já o BM-C-33 está às vésperas de uma decisão final de investimentos. O campo tem estimativa, segundo ela, de escoar 16 milhões de metros cúbicos de gás
Caçula entre as gigantes, a independente Enauta tem o campo de Atlanta, na bacia de Santos, como seu principal projeto. “Planejamos o primeiro óleo do sistema definitivo em meados de 2024”, diz o diretor de operações, Carlos Mastrangelo.
Avaliado em US$ 1,2 bilhão, a capacidade do FPSO, espécie de navio-plataforma definitivo, será de 50 mil barris diários.
Atualmente, a empresa produz cerca de 27 mil barris de óleo equivalente (boe, inclui petróleo e gás), somando Atlanta – com um sistema de produção antecipada, o FPSO Petrojarl I – e o campo de gás de Manati, na bacia de Camamu (BA). O óleo produzido em Atlanta é comprado pela Shell. O gás de Manati é vendido para a Petrobras e o condensado ofertado ao mercado baiano.
Depois de um período emperrado, o setor dá sinais de aumento de encomendas. Para o country manager da Aker Solutions, Volmir Korzeniewski, o momento é positivo para a indústria de óleo e gás no país e a empresa está investindo R$ 100 milhões neste ano na ampliação da capacidade de produção de equipamentos submarinos. É o montante anual que vem sendo aportado desde 2021, mas a expectativa é superar essa marca em 2024. “Em outubro do 2022, tínhamos uma carteira de projetos em execução de cerca de 80 árvores de Natal molhadas (ANM). Hoje, são 130 equipamentos.”
Segundo a Associação Brasileira das Empresas de Serviços de Petróleo (ABESpetro), os diversos segmentos do setor de óleo e gás – atividades de sísmica, perfuração e construção de poços, fabricação e instalação de equipamentos submarinos e construção e operação de unidades flutuantes de produção – têm dinâmicas e velocidades distintas de crescimento, mas como um todo houve expansão de dois dígitos em 2022 sobre o ano anterior.
A maior parte desse crescimento na demanda por bens e serviços é puxada pela Petrobras, que responde por 90% da produção nacional. “O preço do barril elevado viabiliza uma série de projetos que estavam estagnados”, avalia Anderson Dutra, sócio da KPMG. Segundo ele, o país tem no pré-sal um ativo interessante, porque possui um custo de extração A maior parte desse crescimento na demanda por bens e serviços é puxada pela Petrobras, que responde por 90% da produção nacional. “O preço do barril elevado viabiliza uma série de projetos que estavam estagnados”, avalia Anderson Dutra, sócio da KPMG. Segundo ele, o país tem no pré-sal um ativo interessante, porque possui um custo de extração competitivo, com volumes bem elevados de produção. Isso gera um grande estímulo para investimentos relevantes.
Pedro Souza, sócio da consultoria Bip, diz que a tendência para este ano é a demanda por petróleo seguir elevada como em 2022. Ele aponta para uma remodelação do contexto geopolítico da indústria, a partir de fatores como a guerra na Ucrânia, que fez o Ocidente isolar a Rússia. O país governado por Vladimir Putin se voltou para a Ásia. Já os Estados Unidos liberaram suas reservas estratégicas de petróleo e pressionaram a Opep a aumentar a ofertas.
“No entanto, contrariando as expectativas do mercado, a Opep e seus aliados anunciaram cortes mais agressivos na produção”, diz Souza. Para ele, mesmo com investimentos crescentes em fontes renováveis, um cenário de curto prazo sem hidrocarbonetos é inviável. E o gás, visto como combustível da transição para uma economia de baixo carbono, tem atraído as empresas.
O setor de gás tem mostrado números positivos. As distribuidoras seguem investindo em suas redes de distribuição. No ano passado, esse aumento foi de 3,1% acima de 2021. Em consumidores conectados, a alta foi maior: 5,8%. Sem contar o segmento térmico, o consumo médio de gás natural em 2022 no Brasil foi de cerca de 45,1 milhões de metros cúbicos por dia, 7,2% acima de 2021. O destaque foi a indústria: 31,6 milhões de metros cúbicos por dia ante cerca de 29,5 milhões em 2021.
Para Augusto Salomon, presidente da Abegás, o aumento da capacidade do gasoduto Bolívia-Brasil (Gasbol), operado pela TBG, é uma prioridade para o setor. Por isso, ele vê como fundamental o sucesso da chamada pública da ANP, prevista para este semestre, visando expandir a capacidade da malha de transporte no Centro-Sul.
“O Sul é uma região estratégica, com elevada demanda térmica e que precisa de mais investimentos em infraestrutura essencial”, diz. Segundo ele, as limitações do Gasbol estão impedindo o desenvolvimento do mercado de gás natural nos três Estados sulistas, especialmente Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
Fonte: Valor Econômico
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