Em artigo publicado no portal Poder 360, o diretor do CBIE, Adriano Pires, afirma que
As fontes de energia fósseis são, historicamente, a base do sistema energético mundial. Por serem fontes de grande potencial poluente, os combustíveis de origem fóssil estão sendo gradualmente substituídos pelas renováveis, por meio de um processo denominado transição energética. O fenômeno tem como objetivo final a descarbonização da matriz energética e a mitigação do aquecimento global.
O gás natural surge nesse interim com função estratégica na tão almejada transição. Isso, porque o gás é o mais limpo entre os combustíveis fósseis e, dado o devido tratamento, pode ser um substituto direto para muitos dos fósseis, possibilitando uma mudança gradual e segura. A ideia é que o combustível atue como fonte de base para equalizar a geração renovável, em sua maioria intermitente e sazonal.
O Brasil tem a possibilidade de atuar na vanguarda desse processo. A produção nacional, em 2022, foi de 137,86 milhões de m3/d de gás. Deste total, a oferta nacional disponível foi de 47,56 milhões de m3/d, o que representa 34,5% da produção. Chama a atenção a parcela de gás reinjetado, que é crescente ao longo dos anos, e já corresponde a quase 50% do volume produzido, o que equivale a 68,38 milhões de m3/d. Os demais descontos da produção são referentes à queima e perda (13,4%) e consumo próprio (2,5%).
Ainda que a matriz elétrica nacional seja predominantemente limpa, com 87,9% de renováveis em 2022, segundo o BEN (Balanço Energético Nacional), da EPE, o gás pode ser um combustível mais atuante, em diferentes setores da economia, como o industrial e o de transporte. Embora a percepção sobre energia geralmente fique restrita ao setor elétrico, em 2022, o gás respondeu por 18,6% do consumo final de energia primária no Brasil.
Ao se observar a nossa matriz energética, fala-se da energia em sua forma primária, desde a energia calorífica dos motores de carros e fornos industriais até a eletricidade que carrega os aparelhos celulares. Portanto, é importante expandir os horizontes do que é energia e em quais formas ela chega ao consumidor.
O setor elétrico doméstico já foi acometido por significativas crises hídricas e os empreendimentos de geração baseados em fontes eólica e solar vem ganhando cada vez mais espaço na matriz, que se mostra cada vez mais dependente e vulnerável às condições climáticas e fatores naturais. Assim sendo, o fornecimento de eletricidade fica sujeito à disrupções nos fluxos de energia e instabilidade e insegurança do fornecimento. Nesse cenário, usinas térmicas de base a gás natural, despacháveis e seguras, atuam como um regulador para balancear o sistema ao mesmo tempo que reduzem às emissões em comparação à térmicas tradicionais a óleo combustível ou diesel.
Fora do setor elétrico, o gás natural tem um papel ainda mais proeminente, basta observar o histórico da OIE (Oferta Interna de Energia) do Brasil. Nos últimos 10 anos, de 2013 a 2022, o gás natural manteve uma participação consistente na OIE, sempre na faixa de 10-13%. Ainda que a nossa matriz elétrica seja excepcionalmente limpa, a matriz primária é composta majoritariamente por fontes fósseis (51,4%). Em outros setores, como o residencial e, especialmente, o industrial e o de transporte, o gás natural pode ganhar espaço substituindo as fontes mais poluentes sem incorrer em custos de menu elevados.
O país tem capacidade para atender a toda a nossa demanda doméstica e mais. A produção bruta nacional de gás tem grande potencial de expansão, com o pré-sal sendo o grande motor do crescimento. Atualmente, o pré-sal responde por 74% do volume total. É importante lembrar, também, na recuperação dos campos maduros e desenvolvimento de novos campos onshore, a partir da entrada de novos produtores no setor. Isso, sem falar de nossas reservas, que de acordo com a ANP, representam cerca de 587,9 bilhões de m³ de gás natural. Destacando que estão fora desse valor outras áreas de elevado potencial, como a Margem Equatorial e os recursos não-convencionais, o chamado gás de xisto.
Ainda não foram realizados estudos oficiais acerca da quantidade de gás natural na Margem Equatorial. Porém, a exploração de regiões com formação geológica similar na Guiana, Suriname e Oeste da África reforça a hipótese de as bacias da região sejam ricas em gás. As reservas de gás não-convencional já foram estudadas pela U.S. Energy Information Agency (EIA) que, no documento “Technically Recoverable Shale Oil and Shale Gas Resources: Brazil, de 2015 apontou para o potencial de 36,2 trilhões de m³ de gás natural in situ, sendo ao menos 6,9 trilhões de m³ recuperáveis, em 3 bacias: Solimões, Amazonas e Paraná. No caso de comprovação deste volume, o país se posicionaria entre as 5 maiores reservas de gás natural no mundo.
Portanto, há sim gás natural no Brasil. E não é pouco.
Fonte: Poder 360 – Adriano Pires