O Brasil precisa criar políticas públicas para impulsionar a transição energética na matriz de transportes, com a substituição do diesel por combustíveis mais limpos, defendeu na quarta (18) o diretor Técnico-Comercial da Abegás, Marcelo Mendonça, em painel no primeiro dia de programação do XIII Congresso Brasileiro de Regulação da Associação Brasileira de Agências Reguladoras (Abar), em São Paulo.
“O setor de transporte é o maior responsável pelas emissões relacionadas com pegada de carbono no país”, destacou Mendonça. Segundo ele, a substituição de diesel por gás natural equivale a uma redução de 11,5 milhões t/ano de emissões de carbono, enquanto a troca pelo biometano poderia gerar uma redução de 46 milhões t/ano.
De acordo com dados do Ministério de Minas e Energia, o setor de transportes representa 1/3 do consumo de energia no Brasil e o óleo diesel corresponde a 44% do combustível usado na matriz de transporte.
Para Mendonça, o Brasil tem uma oportunidade para desenvolver essa infraestrutura com o aumento de oferta de gás natural de pelo menos 50 milhões de metros cúbicos/dia com a entrada em operação dos gasodutos de escoamento Rota 3 e das novas fronteiras de produção como o Bacia Sergipe-Alagoas e o Projeto BM-C-33.
Uma das vantagens é que o país já conta com tecnologia, inclusive com produtores e importadores de veículos pesados globais como Scania, Iveco, MWM e FTP, que têm vários modelos habilitados – ou com gás natural comprimido ou GNL.
Corredores sustentáveis
Uma das oportunidades, disse o diretor da Abegás, é fomentar os chamados corredores sustentáveis, como existe na Europa e nos Estados Unidos, incentivando a estruturação de postos de combustíveis para abastecer caminhões e ônibus nas principais vias logísticas onde há redes de abastecimento de gás canalizado. O projeto seria em duas ondas, prioritariamente em rodovias que conectam as capitais, no Sudeste e no Nordeste, e em seguida em rodovias para o interior.
“Fizemos um estudo com as associadas da Abegás e mapeamos mais de 50 rodovias. Só no Sudeste são 35 rodovias. Fizemos um mapa de calor onde há maior circulação de veículos. E constatamos que temos postos já instalados e onde passando a rede de distribuição porque um caminhão a gás tem autonomia de 450 quilômetros e analisamos onde há gargalos de abastecimento para que as distribuidoras possam ocupar esse caminho”, explicou Mendonça.
Outro estudo é a adoção de gás natural em ônibus. “Em São Paulo, por exemplo, seria fácil implementar. O Sistema SPtrans tem 51 bases e 32 delas com a rede de distribuição de gás canalizado na porta das garagens e as demais 19 estão a cerca de 1 quilômetro da rede mais próxima”, disse Mendonça.
A adoção do gás natural, destacou o executivo da Abegás, poderia abrir a porta para a gradual substituição para o biometano, a exemplo do que fez a Suécia, na medida que a produção de gás renovável foi ampliada em aterros sanitários.
Entre as políticas públicas defendidas pela Abegás estão, sob o âmbito federal, o apoio aos corredores logísticos, a abertura de linhas de créditos especiais nos bancos públicos federais e BNDES e medidas de incentivos através dos impostos federais (Pis e Cofins).
Já no âmbito estadual, medidas para equilibrar os valores do IPVA e outras para equilibrar a cobrança de ICMS (atualmente superior ao do diesel) e a inclusão do gás natural e biometano nas novas licitações de transporte público nas capitais, bem como a inclusão do gás natural e biometano na coleta de resíduos urbanos nas capitais).
O Brasil já conta com aproximadamente mil veículos pesados rodando a gás natural. “É importante dar velocidade nessa substituição. Por isso, nós temos essa necessidade de criar políticas públicas”, encerrou Mendonça.
Projeto de lei propõe corredores sustentáveis
Outro participante do painel, o deputado federal licenciado e Secretário de Energia e Economia do Mar do Estado do Rio de Janeiro, Hugo Leal, destacou que protocolou na primeira semana deste mês, na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei Nº 4861/2023, justamente com a finalidade de criar uma política de incentivos para estimular o uso de combustíveis com menor emissão de carbono, incluindo a substituição do diesel por combustíveis como o biometano e o gás natural.
Ele ressaltou a importância do GNV para o estado do Rio, onde o segmento responde por mais de 3 milhões de metros cúbicos diários no consumo, e onde mais de 600 postos estão habilitados para abastecer com gás natural. E anunciou que no dia 27 de outubro o governo estadual vai lançar o programa Corredores Sustentáveis, iniciativa que já conta com o apoio dos agentes.
“Concessionárias, sindicatos de postos, estão todos alinhados. É preciso que os postos estejam adaptados para abastecer com caminhões, com testeiras adequadas”, disse ele, destacando que a Via Dutra já tem postos com essas características. “Para nós o que importa é que reduza a pegada de carbono”.
De acordo com Luiz Carlos Taoni Neto, membro do Conselho Deliberativo da Federação Nacional Distribuição Veículos Automotores (Fenabrave), a indústria tem compreensão da importância de fazer parte da solução no processo de transição energética. “Uma das nossas necessidades prementes é ter a rede de abastecimento”, enfatizou. “Com essa rede é possível ter autonomia para rodar”, complementou.
Para Ramons Alcaraz, CEO da JSL, empresa de transporte rodoviário de cargas, em centros urbanos a empresa já tem experiência de transição energética com veículos elétricos, mas que em longas distâncias o gás aparece como uma alternativa para ganhos de escala. Ele apontou alguns desafios para o abastecimento, mas disse que tem aberto diálogos com clientes interessados em reduzir a pegada de carbono para que o investimento nesses veículos possa ser absorvido no capex.
De acordo com o Superintendente de Serviços de Transporte Rodoviário e Multimodal de Cargas da ANTT, José Aires Amaral Filho, é impossível pensar em políticas de descarbonização sem pensar na indústria de óleo e gás, uma vez que há redução de emissões de gases de efeito estufa e que, nos grandes centros urbanos, a transição para o gás natural apresenta externalidades positivas como a redução de emissões de poluentes prejudiciais positivos.
“A gente entende como fundamental a renovação de frotas que olhe sim para uma transição energética mais sustentável”, disse ele, informando que a média de ciclo de vida dos veículos em frotas é de 14 anos, chegando a alguns casos a 22 anos. Uma das ideias da ANTT, disse ele, é mensurar as emissões dos veículos e talvez criar um selo para reconhecer frotistas que tenham boa avaliação. “Estamos colocando na nossa agenda regulatória do próximo ano a avaliação da frota dos transportadores”, informou.
Segundo Mário Jorge Confort, da Superintendência de Infraestrutura e Movimentação (SIM) da ANP, a Constituição Federal separa bem as competências e a distribuição de gás canalizado é de responsabilidade estadual, mas a agenda regulatória da agência vem examinando temas que poderão facilitar essa transição para o uso de gás natural em veículos pesados como aa regulamentação de distribuição para veículos por GNL e GNC.
Para o presidente executivo da Associação de Empresas de Transporte de Gás (ATGás), Rogerio Manso, a prioridade, do ponto de vista desse elo da cadeia, é garantir o máximo de pontos de suprimento com competição entre as diversas oportunidades para que produto chegue a um preço competitivo.
Fonte: Brasil Energia