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Construção de novas termelétricas consolida gás natural como fonte de energia complementar às renováveis

As termelétricas a gás natural voltam a ganhar destaque no mercado como garantia de forn estável de energia elétrica. Em Caçapava, no Vale do Paraíba (SP), está em estudo a instalação da Usina Termelétrica São Paulo, com capacidade de 1.743,8 MW. A primeira audiência pública sobre o projeto estava marcada para ocorrer no início deste mês, mas a etapa foi suspensa por uma decisão liminar da Justiça. O empreendimento é da Natural Energia, empresa do Rio de Janeiro e que atua com geração eólica e solar no Ceará, Rio Grande do Norte e Minas Gerais, que planeja o início das operações em cinco anos.

Mas este não é o único empreendimento do gênero que está prestes a sair do papel. Dados da Aneel compilados pela Orbsee Technologies mostram que o país tem 319 termelétricas (UTE) em operação, com capacidade acima de 30 MW — 202 delas operam com resíduos agroflorestais, 61 a gás natural, 41 a óleo, 10 a carvão e cinco em outras modalidades. Segundo a agência reguladora, existem outras 37 UTES em construção. Em São Paulo, 71% da geração de UTEs advém de biomassa e as usinas a gás natural somam apenas 51. Em 2022, com as chuvas mais fartas nos reservatórios, as termelétricas tiveram queda de 32% no fornecimento para o setor elétrico como um todo. Sua participação na matriz elétrica brasileira ficou em apenas 6,1%, abaixo dos 11,8% das eólicas, por exemplo.

O professor Fernando Caneppele, especialista em energias renováveis da USP e pesquisador do uso de inteligência artificial no mercado elétrico, diz que o gás natural é hoje a principal fonte de transição para garantir o fornecimento energia firme. “Entre os combustíveis fósseis, o gás natural é o menos poluente. Estamos avançando, mas ainda é impossível armazenar energia das fontes renováveis em baterias para abastecer grandes centros urbanos ou países. A saída é fazer a gestão inteligente da demanda por energia elétrica, investir em redes inteligentes de transmissão e distribuição e diversificar as fontes de energia”, avalia.

Segundo a Natural Energia, o objetivo do seu projeto é gerar energia para o Sistema Interligado Nacional (SIN), contribuindo para garantir energia firme na região, conhecida como “Vale do Silício brasileiro”, pela presença de indústrias de alta tecnologia na vizinha São José dos Campos.

A região é abastecida por gasodutos e abriga pontos de conexão com o sistema interligado. “Começamos a perceber que, sem o suporte de energia firme, as fontes de energia renováveis não conseguem crescer. As termelétricas funcionam como reserva de longo prazo, como um seguro para o setor elétrico. O funcionamento é complementar às fontes renováveis, já que as eólicas precisam de ventos constantes e as solares não funcionam à noite”, diz Ricardo Martins, cofundador e CEO da Natural Energia. A empresa não se afastou do seu DNA de energia renovável, mas acredita que a disponibilidade de energia estável é essencial para o setor elétrico na medida em que as mudanças climáticas apontam para eventos de secas extremas ou prolongadas, que podem afetar a capacidade das hidrelétricas de exercer esse papel.

Caneppele, da USP, lembra que o apagão de 2001 mostrou que o Brasil era muito dependente das hidrelétricas e que essa dependência de uma fonte predominante é ruim, mesmo sendo uma fonte renovável. O professor diz ainda que é importante ter essas usinas termelétricas perto de grandes centros urbanos, para evitar perdas nos sistemas de transmissão. Quanto mais perto dos centros consumidores, segundo ele, melhor. A cidade de São Paulo, por exemplo, tem hoje duas UTEs a gás natural, uma delas perto da represa Billings. “Não existe energia totalmente limpa. As placas solares fornecidas pela China, por exemplo, usam energia a carvão para serem produzidas”, ressalta.

Reinaldo da Cruz Garcia, diretor de Estudos de Energia Elétrica da EPE, ligada ao Ministério das Minas e Energia, afirma que as termelétricas, em especial as movidas a gás natural, continuarão exercendo importante papel para segurança do suprimento de energia elétrica no Brasil. “Em diversos países, o gás natural é o principal combustível na transição energética, por garantir a entrada segura de fontes renováveis com um nível de emissão de gases causadores do efeito estufa menor quando comparado com outros combustíveis fósseis.

No Brasil, além de ajudar na segurança do sistema para compensar a variação das fontes eólicas e solares, as termelétricas também são muito importantes nos momentos em que chega pouca água aos reservatórios das hidrelétricas. Quando temos longas estiagens, outras tecnologias são necessárias para substituir, de modo constante, a oferta hidrelétrica”. Segundo ele, a diversidade de modelos de negócios permite que as termelétricas sejam usadas para geração em momentos de carga máxima do sistema, que ocorrem em períodos de temperaturas muito elevadas — como tem ocorrido durante as ondas de calor, cada vez mais comuns no país. Em novembro passado o país bateu o segundo recorde consecutivo de consumo de energia elétrica. Foi o maior consumo de toda a série histórica desde 2004, segundo a EPE. O aumento do consumo foi impulsionado pelas ondas de calor. Residências e comércio tiveram aumentos acima de dois dígitos. Garcia lembra que a EPE está atenta à segurança do Sistema Interligado Nacional devido ao alto grau de penetração de fontes renováveis e que o desafio não é só no Brasil, mas de muitos outros países.

“O Brasil tem grandes reservas de gás natural, em especial as do pré-Sal e o aproveitamento desse recurso será necessário não só para o setor elétrico, mas também para ajudar o desenvolvimento da economia e o fortalecimento do mercado interno de gás natural”, diz.

Fonte: O Globo

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