De contrato renovado — e ampliado — com a YPFB, para importação de gás natural da Bolívia por mais três anos, a Delta Energia mira o desenvolvimento de produtos flexíveis no mercado livre no Brasil. A comercializadora brasileira quer explorar a demanda de consumidores por volumes que ajudem a complementar flutuações no consumo, por exemplo. Esse tipo de serviço casa com a natureza interruptível dos acordos celebrados com a estatal boliviana YPFB.
“Existem diversos consumidores que procuram essas alternativas, que procuram competitividade nisso e o foco é esse: é atender esses vazios, esses espaços que são deixados e que a gente consegue fazer os encaixes… É o que o mercado livre pede, no final do dia: uma criatividade nova”, disse o presidente da Delta Geração, Alessandro di Domenico. Ele compara o desenvolvimento do mercado livre de gás com a abertura do setor elétrico, no fim da década de 1990: “Foi assim com o começo das comercializadoras de energia. Elas também foram [se formando] para atender essas diferenças de cargas”, afirmou.
A Delta celebrou dois contratos com a YPFB, ambos com previsão de importação de até 1,551 milhão de m3/dia até o fim de 2026: um deles para desenvolvimento da comercializadora de gás e um segundo acordo para suprir a demanda da termelétrica William Arjona (190 MW), localizada no Mato Grosso do Sul e comprada pela Delta Geração em 2019. YPFB e Delta já tinham relações comerciais desde 2021, quando a empresa brasileira foi à Bolívia em busca de gás para sua termelétrica – reativada naquele ano, no meio da crise hidrológica que disparou os preços da energia. O acordo original de importação venceu no fim do ano passado e previa a compra de até 1,35 milhão de m3/dia.
O braço de comercialização de gás é mais recente: começou a rodar em 2023, com a obtenção das autorizações da ANP para importação. O desenvolvimento do negócio ainda não deslanchou. Domenico, contudo, vê o mercado livre de gás no Brasil em ascensão e crê que o seu florescimento é uma questão de tempo. “De largada tiveram pouquíssimos clientes. E, para a comercializadora, há também uma maturação. Há, sim, uma evolução. O mercado ainda não tem uma velocidade desejada, mas está acontecendo. Tem vários estados aí que estão amadurecendo [com seus marcos regulatórios]”, comentou. “Porque os estados têm um papel importantíssimo. E eles estão tentando entender qual é a verdadeira demanda dos consumidores.
A demanda em todos os sentidos, qualitativos principalmente, de modo que haja uma evolução dessas legislações estaduais”, completou. Pelos termos do acordo com a YPFB, os pedidos de importação são confirmados de véspera, de acordo com a disponibilidade por parte dos bolivianos. Domenico diz que tem “boas expectativas” de que haverá janelas de importação, mesmo com as restrições na oferta de gás boliviano. A YPFB possui alguns contratos interruptíveis com algumas comercializadoras privadas brasileiras – além da Delta, empresas como Tradener, Blueshift e MDC também tem acordos interruptíveis com a Bolívia. Essas empresas, contudo, vêm enfrentando dificuldades, na prática, para conseguirem acionar as remessas da Bolívia, por restrições na oferta do país vizinho. No fim do ano passado, Petrobras e YPFB revisaram os termos do contrato de exportação do gás boliviano ao Brasil. Na ocasião, as estatais anunciaram que a renegociação do contrato flexibilizava penalidades e tendia a abrir espaço para que os traders privados importem mais gás do país vizinho. Esses agentes, porém, devem continuar a enfrentar, em 2024, a concorrência da Argentina pela oferta declinante de gás da Bolívia.
O contrato recém-assinado com a YPFB para abastecimento da UTE William Arjona vai até 2026, a partir de quando começa a valer o contrato de reserva de capacidade conquistado pela Delta em 2021, no primeiro leilão do tipo realizado pelo governo brasileiro. Até lá, a Delta mira oportunidades de comercialização de energia de William Arjona no Mercado de Curto Prazo. Di Domenico conta também que a empresa avalia participar do leilão de reserva de capacidade deste ano – um novo projeto no Mato Grosso do Sul, onde está instalada William Arjona, é uma possibilidade.
A UTE William Arjona foi comprada pela Delta em 2019, então fora de operação. Em 2021, durante a crise hídrica, a empresa viu uma oportunidade de retomar as atividades da termelétrica – uma usina Merchant, ou seja, que vende energia exclusivamente no Mercado de Curto Prazo e é acionada pontualmente. Di Domenico explica que, para honrar o contrato de reserva de capacidade, a Delta ainda busca no mercado um contrato de suprimento de gás natural de longo prazo. Na ocasião da licitação, a empresa apresentou um comprovante de disponibilidade futura de gás da YPFB e de uma outra empresa, que atua na importação de GNL.
A companhia, contudo, busca outras alternativas. De acordo com o executivo, a “maré está a favor”, diante do aumento do número de supridores no mercado brasileiro nos últimos anos. “A gente tinha lá [em 20021], quando William Arjona entrou em operação, poucas opções fora da Bolívia e a própria Petrobras”, lembra o vice-presidente Institucional e Regulatório do Grupo Delta Energia, Luiz Fernando Vianna. “E [os novos fornecedores] estão tendo condições de ofertar cada vez mais quantidades maiores de gás… E os próprios contratos têm evoluído, têm cada vez mais incorporado essas condições flexíveis.
Uma térmica dessa natureza é um novo produto, um produto de reserva de capacidade”, complementou Domenico. Segundo ele, o fato de William Arjona não ser uma usina de grandes proporções também favorece a busca por supridores. “A gente tem um modelo que é bom, com tamanho bom, que está adequado ao que o mundo do gás térmico tem a ofertar para os próximos anos”, disse.
Fonte: Epbr
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