Para Marcelo Mendonça, PL 1.425/2021, que propõe definição de gasodutos de transporte, fere a Constituição ao interferir na competência dos estados.
As distribuidoras de gás canalizado apontam risco de judicialização para a cadeia do gás natural, caso o Projeto de Lei 1.425/2021, do deputado federal Ricardo Barros (PP-PR), que propõem uma nova definição para gasodutos de transporte, com base na pressão máxima de operação maior ou igual a 30 bar (kgf/cm²). Na avaliação da Abegás, grande parte dos dutos de distribuição poderia ser reclassificada, uma vez que parte das redes das distribuidoras supera esse limite. Em entrevista ao EnergiaHoje, Marcelo Mendonça, diretor de Estratégia e Mercado da Abegás, avalia o projeto como inconstitucional e sua aprovação poderia levar à judicialização do setor.
Como a Abegás avalia esse projeto?
Essa proposta poderá ocasionar uma interferência indevida na competência dos estados. Uma eventual aprovação desse PL abre a possibilidade de a ANP classificar como gasodutos de transporte uma parte significativa do que hoje são gasodutos de distribuição, uma vez que uma parcela destes dutos supera a pressão máxima de operação prevista no PL.
Historicamente, os gasodutos foram diferenciados pela função ou atividade a que se propõem. A distinção entre gasodutos de transporte e distribuição não foi feita em função do diâmetro, da pressão de operação ou se há necessidade de odorização do gás natural, o que foi alterado pela Nova Lei do Gás, em fase de regulamentação.
A Abegás considera o projeto inconstitucional? Por quê?
O PL claramente busca sedimentar uma lógica incompatível com a diferenciação estabelecida no § 2º do Art. 25 da Constituição Federal. A Constituição foi precisa e taxativa quando estabeleceu como competência dos estados os serviços locais de gás canalizado. Essa delimitação decorre da necessária autonomia federativa, base para o Estado de Direito, que leva em conta interesses locais ou regionais, reservando à União apenas os interesses nacionais ou supranacionais. Na nossa análise, legislação infraconstitucional e mesmo atos regulatórios ficam impedidos de promover alterações, mesmo que interpretativas, em relação ao comando fixado no texto da Carta Magna.
Qual o impacto desse projeto no ambiente de negócios da cadeia produtiva do gás?
O projeto tumultua o rito ao propor alterações para uma lei recém sancionada e que nem mesmo foi regulamentada. Isso traz imprevisibilidade para o mercado e, já na largada, prejudica o desenvolvimento esperado para o setor de gás.
Além disso, a migração de ativos de distribuição para transporte, pode resultar em maior perda de competitividade do gás natural para os consumidores finais. Principalmente se considerarmos que, até o momento, as transportadoras do Nordeste e Sudeste não realizaram revisões tarifárias de sua malha, prática recorrente no setor de distribuição para a manutenção da modicidade tarifária para os consumidores.
A interferência da legislação federal nos estados impede o desenvolvimento do setor de distribuição, justamente no momento que precisamos ampliar a infraestrutura, e reduz a segurança do sistema ao impedir a construção de reforços de rede, prejudicando até mesmo os consumidores existentes.
Corremos o risco de judicialização, caso essa proposta avance?
Sem dúvida. O envolvimento do Judiciário deve levar o setor a uma inevitável judicialização, se prosperar essa nítida tentativa de invasão de competência, de um órgão federal sobre ativos hoje sob esfera estadual.
A Lei do Gás prevê que a definição do gasoduto de transporte deve ser feita pela ANP. Na visão da Abegás, essa definição deveria ser feita pela agência ou deveria estar prevista em lei?
O melhor para o Brasil é um conjunto de medidas infralegais, na regulamentação da Nova Lei do Gás (Lei nº 14.134/2021), que impeçam a judicialização. Mas o principal é que na regulamentação do decreto fique clara a não invasão de competências. É fundamental que o conceito de gasoduto resguarde a competência dos Estados sobre os serviços locais de gás canalizado, conforme prevê o artigo 25, § 2º da Constituição Federal de 1988. Gasodutos de distribuição são de competência estadual.
Fonte: EnergiaHoje
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