Dos combustíveis e forma gasosa, que se complementam, também são opções viáveis para a redução das emissões poluentes dos sistemas de transportes. De origem fóssil e renovável, o gás natural e o biometano têm a possibilidade de contribuir positivamente com o novo cenário de mobilidade urbana, sustentável em termos ambientais e econômicos. A revista Autobus entrevistou Marcelo Mendonça, diretor de Estratégia e Mercado da Associação Brasileira de Empresas Distribuidoras de Gás Canalizado (Abegás) sobre a maior participação desse tipo de combustível no segmento de transporte coletivo.
Revista Autobus — O primeiro mundo dita regras e neste período vemos que a eletrificação é uma tendência no mercado do transporte coletivo urbano num cenário pós 2030. Porém, estamos no Brasil e aqui a coisa é mais embaixo. A Abegás já traçou algum cenário para o modal nesse período até 2030?
Marcelo Mendonça — Sim. Cada país tem que aproveitar sua potencialidade e o Brasil terá uma excelente oportunidade para aumentar a produção de gás natural na próxima década. Hoje, nós somos importadores de diesel, com um gasto que ultrapassa os US$ 7 bilhões por ano, portanto faz todo o sentido buscarmos a substituição do diesel por gás natural.
No Brasil, em um cenário até 2030, o gás natural será a única opção para a redução da dependência da importação do diesel. Como já possuímos infraestrutura disponível de rede de distribuição nos grandes centros, o gás natural é a melhor opção para avançarmos rapidamente nessa agenda.
Revista Autobus — Vemos um mercado de transporte resistente ao gás natural, estou certo? Caso sim, por que isso acontece? E como quebrar essa barreira?
Marcelo Mendonça — Ainda há um certo desconhecimento sobre todo o potencial do gás natural para fins automotivos. A indústria evoluiu muito em nível global. Hoje, em diversos países da Europa e nos Estados Unidos, o gás natural é adotado em transporte público, na coleta de lixo e no transporte de carga.
Há atrativos econômicos, sociais e ambientais que justificam seu uso: redução de custos com combustíveis, redução do impacto na saúde da população, uma vez que o gás natural emite muito menos materiais particulados e gases que o diesel; e redução das emissões de gases causadores de efeito estufa (GEE).
Para quebrar essa barreira é necessário que os governos deem os sinais corretos, com um conjunto de políticas públicas que incentivem seu uso.
Hoje, o mercado consegue responder com certa rapidez a esses sinais — as principais capitais brasileiras têm rede de gás natural capilarizadas, em condições de abastecer os veículos e as principais montadoras do mundo já fabricam diversos modelos movidos a gás natural — no Brasil, por exemplo, a Scania já produz um modelo que roda com gás natural e biometano, exportando para países como a Colômbia.
Então, na nossa visão, é preciso vontade política e integração entre os diversos atores do setor público e do setor privado para fazer acontecer.
O Brasil precisa acelerar essa agenda, já que assumiu no Acordo de Paris o compromisso de reduzir suas emissões de CO2 em até 37% até 2025 e até 43% até o ano de 2030 em relação aos números de 2005.
O uso de GNV pode reduzir as emissões de GEE (Gases causadores de Efeito Estufa), condição indispensável para o cumprimento de compromissos firmados pelo País no Acordo de Paris, e também diminuir significativamente o impacto da severa emissão de material particulado (PM5), óxido de nitrogênio (NOX) e óxidos de enxofre (SO2) no ar das cidades, extremamente prejudiciais à saúde. Estima-se que a redução de emissões de CO2 varie de 15% a 20%, na substituição do diesel.
O momento é agora.
Revista Autobus — A entidade acredita que a sinalização do Governo Brasileiro no sentido a estimular o maior uso do combustível gás natural possa movimentar o segmento de transporte coletivo nas cidades?
Marcelo Mendonça — Nossa expectativa é essa. O próprio ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, já manifestou posição favorável ao uso do gás como substituto do diesel no frete. É natural que essa aplicação também seja utilizada em ônibus municipais e intermunicipais, como acontece – com sucesso – em países vizinhos como Peru, Chile e Colômbia. Basta adotar as políticas públicas que incentivem o desenvolvimento desse mercado.
Revista Autobus — Tecnologicamente, o setor de gás vive um outro momento, totalmente diferente de anos atrás. É preciso pensar em algo mais no tocante de uma economia de escala de maior porte?
Marcelo Mendonça — As tecnologias desenvolvidas para os ônibus a gás natural estão mais eficientes, com eletrônica embarcada e controles de última geração, que garantem o atendimento às normas de emissões mais rigorosas do mundo, como a Euro VI.
Como eu disse antes, algumas das principais montadoras em todo o mundo, como a Volkswagen, Scania e Iveco, produzem veículos que mantêm o desempenho de outros funcionando a diesel, mas com menos ruído (o que é vantajoso nas cidades, reduzindo impacto acústico sobre hospitais, escolas e sobre a qualidade de vida das pessoas).
Na Espanha, um dos terminais de abastecimento, no bairro de Sanchinarro, é administrado por uma concessionária que arca com todos os custos de manutenção e mantém uma equipe técnica permanente no local. A estação é capaz de abastecer até 180 veículos por hora e tem acesso público — também pode ser usada por outros ônibus, carros de passeio, furgões e caminhões que recolhem lixo, contribuindo para a sustentabilidade econômica do negócio.
No transporte intermunicipal, muitos países europeus e da América do Norte vêm criando corredores logísticos que contam com dezenas de postos ao longo das rodovias, todos plenamente estruturados para abastecer veículos pesados.
Tudo isso já seria perfeitamente possível, por exemplo, no corredor entre Santos e a Grande Campinas, onde há grande oferta de gás, ou no Estado do Rio.
São exemplos que mostram o papel dos governos é decisivo para desenvolver o uso do gás natural no transporte público urbano, com ganhos econômicos e ambientais. Acreditamos que esses projetos possam ser estruturados com as políticas públicas que deem sinais regulatórios e garantam a segurança jurídica para os investimentos privados, além de um plano para expansão e interiorização da malha de gasodutos pelo País.
Revista Autobus — Como a Abegás está trabalhando no fomento desse assunto para o mercado nacional da mobilidade urbana?
Marcelo Mendonça — Como porta-voz das distribuidoras de gás canalizado, a Abegás há 30 anos vem defendendo o desenvolvimento de mercado, de modo a levar os benefícios dessa fonte energética para o maior número de consumidores em condições competitivas. Somos embaixadores do uso automotivo do gás natural, com segurança, eficiência e economia.
Nossa atuação, ao longo de todo esse tempo, tem trabalhado no sentido de ampliar o conhecimento sobre o combustível, no desenvolvimento de normas técnicas para garantir a segurança dos usuários e, num plano mais institucional, buscando junto ao governo, as agências reguladoras e ao próprio mercado mostrar as vantagens econômicas, ambientais e sociais do uso do GNV.
Para isso, vamos realizar nos dias 24 e 25 de outubro, no Rio de Janeiro, pelo segundo ano consecutivo, o “Seminário Internacional de Mobilidade a Gás Natural – A Solução para o Brasil” – evento que reúne representantes do governo, da iniciativa privada, das instituições acadêmicas e de pesquisa, bem como de organizações não governamentais. A finalidade é debater e encontrar caminhos para que possamos avançar nessa agenda.
Fonte: Revista Autobus
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