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Controladoras de gasodutos admitem risco na Bolívia

Embora a crise na Bolívia não tenha repercussões diretas para a Nova Transportadora do Sudeste (NTS) e para a Transportadora Associada de Gás (TAG), que controlam, respectivamente, a malha de gasodutos no Sudeste e no Nordeste brasileiro, executivos de ambas as empresas reconheceram que os recentes acontecimentos trazem instabilidade para o mercado brasileiro de gás, sobretudo aos planos do governo federal de abertura no setor.

O diretor comercial da NTS, Ricardo Pinto, afirmou ser um “fato dado” a instabilidade gerada pela transição política boliviana e afirmou que isso atrasará ainda mais a chamada pública ao mercado da ANP, sobre a Transportadora Brasileira Gasoduto Bolívia-Brasil (TBG), empresa dona do gasoduto que transporta o gás da Bolívia e que tem a Petrobras como controladora majoritária.

“Achamos que isso, definitivamente, irá atrasar o processo da chamada pública da TBG, porque a YPFB (produtora estatal boliviana) não tem condições de firmar um contrato de longo prazo ou assegurar condições comerciais nessa instabilidade”, disse Pinto. Ele definiu a situação da TBG como uma “incógnita” que pode levar um “bom tempo a ser resolvida”. Além disso, embora tenha lembrado que ainda não houve alterações no regime de fornecimento, avalia que existe a “possibilidade de algum evento acontecer nos próximos dias”.

Para Pinto, essa situação sublinha a necessidade de Brasil e Argentina buscarem soluções alternativas para o gás boliviano. “Nós temos um bilhete premiado, uma condição muito privilegiada que é o potencial de gás do pré-sal”, afirmou.

O diretor de operações da TAG, Emmanuel Delfosse, disse que, a depender de como a situação boliviana evoluir, pode afetar o Brasil, mas garantiu que não haveria impacto para a TAG, há cinco meses controlada pela francesa Engie. Ele disse que a repercussão da crise boliviana pode atingir as empresas carregadoras, que entregam a molécula para transportadoras como a TAG. “Nossa malha está longe de lá, então, para nós, hoje, não tem repercussão. De qualquer forma, não podemos ser culpados por [eventual] falta de gás, o que é responsabilidade do carregador”, disse Delfosse.

O executivo evitou comentar possíveis impactos da crise sobre as operações da Petrobras, mas disse que a Engie, a controladora da TAG no Brasil, já teve experiências com crises políticas, como na Rússia, e que isso nunca afetou a cadeia de gás. “Tem uma questão política e social e uma [outra] questão técnica de produção”, afirmou.

Questionado se a crise atual pode afastar empresas privadas de uma eventual venda de participações de estruturas relacionadas, como o gasoduto da TBG, Delfosse disse que o Brasil precisa do gás boliviano — hoje cerca de 1/5 do volume consumido no país — e que, por isso, prevê resiliência na demanda pelos negócios na região.

“Tem que retomar a discussão da Bolívia daqui a seis meses, mas na teoria eu acho que tem gente interessada em oferecer contrato de gás para o mercado brasileiro nessa zona da TBG”, disse. “Então, para mim, vai ter demanda. Poderia até ser uma [empresa] boliviana criando uma empresa no Brasil”, reforçou. Delfosse acrescentou que a TAG ou a Engie, de forma mais ampla, não tem interesse em comprar participações da TBG ou gás boliviano.

O contrato de fornecimento entre Petrobras e YPFB, fechado em 1999, tem validade até dezembro desse ano, mas as negociações estão paradas desde um mês antes das eleições bolivianas. A Petrobras pode importar até 30 milhões de metros cúbicos de gás natural da Bolívia e tem intenções de reduzir essa quantidade para permitir a entrada de agentes privados na operação de importação.

Estocagem

Delfosse, que falou a jornalistas no 15º seminário Brazil Power & Energy, promovido pela Câmara Americana de Comércio (Amcham), no Rio, disse que a empresa tem forte interesse em investir, no médio prazo, em estocagem de gás e em conexões da malha de gasodutos com a infraestrutura de fornecimento de gás natural liquefeito vindo do mar no Sergipe e no Rio de Janeiro. Controlada pela empresa de energia francesa Engie, a TAG detém gasodutos entre as regiões Sudeste e Nordeste.

A Engie, a Engie Brasil Energia e o fundo de pensão canadense Caisse de Dépôt et Placement du Québec (CDPQ) têm, juntos, participação de 90% na TAG. Os 10% restantes permanecem com a Petrobras, que já sinalizou disposição em vender.

Delfosse disse não ver dificuldades para que a operação ocorra, mas isso dependerá da “sistemática da Petrobras”, afirmou em referência ao plano de desinvestimentos da estatal.

“O prazo para a TAG ser vendida [controle acionário] era de oito meses e demorou dois anos. Um processo de venda de 10% não é tão complexo quanto o do restante, mas o ritmo não é meu”, disse. O executivo estima que o negócio pode ser concluído em até um ano.

Delfosse afirmou que está em diálogo permanente com “agentes interessados” em realizar estocagem de gás, mas frisou que ainda não existe um modelo de negócio rentável para trazer a atividade para o Brasil. “Vamos continuar trabalhando nessa questão. Estamos falando com vários players, tentando achar um caminho para financiamento, vendo os interesses dos agentes nesse serviço.”

Ele defendeu a estocagem de gás como resposta a problemas de segurança energética que envolve tecnologia simples. “É usar um campo no fim do uso dele para injetar gás e comprimir. Não é uma tecnologia da Nasa, mas precisa de capex [investimento] para fazer e um contrato de longo prazo.” O executivo lembrou que, na França, a Engie já trabalha com estocagem há 60 anos.

Sobre as conexões com terminais de GNL da Golar, no Sergipe, e da GNA, no Porto do Açu, no Rio de Janeiro, Delfosse disse que já existem tratativas, mas que a empresa aguarda alguns ajustes legais e o esclarecimento das regras que vão reger o mercado no futuro.

“Seria muito interessante conectar essas novas entradas de gás, já que o negócio está de certa forma, pago pelo modelo de negócio deles [Golar e GNA]. Se conectarmos [a rede da TAG] tem uma relação de ganha-ganha, tanto para eles mesmos, que poderão vender uma parte do gás deles, quanto para o sistema, que teria nova fonte de gás. É nisso que a estamos avançando e vamos poder fazer essas conexões”, afirmou.

Delfosse informou que, uma vez definido os termos da lei, as conexões entre os sistemas teria extensão de cerca de 25 quilômetros e exigiria licenciamento. Por isso, levaria cerca de três anos.

“A questão não é quanto tempo vai durar [a construção], mas ter certeza de que vai acontecer, de que o produtor que vai se concentrar no Açu vai ter a segurança de se conectar ao mercado”, afirmou.

Fonte: Valor Online

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