A indústria de etanol do Brasil avalia como “inconcebível” zerar a taxa para a importação do combustível, uma reivindicação dos Estados Unidos antes do fim de uma cota isenta da Tarifa Externa Comum (TEC) neste mês, e diz estar preparada para avançar no mercado de gasolina após a introdução de novos padrões que devem elevar o custo do combustível fóssil ao consumidor.
O presidente da Unica) Evandro Gussi, disse lamentar que ecoem no governo pedidos dos EUA de isenção da TEC de 20%, ao mesmo tempo em que alguns queiram taxar em 40% os novos créditos de descarbonização (Cbio), um novo ativo ambiental brasileiro.
Os EUA, líderes globais no mercado de etanol, poderiam ampliar fortemente as vendas do combustível ao Brasil, especialmente para o Nordeste, afetando produtores que já enfrentam uma queda de mais de 15% nas vendas, devido às medidas para conter o coronavírus.
“Além de absolutamente inconcebível, criaria um problema sério no Brasil todo, mas em especial para o Nordeste. Não tem nenhuma razão (a isenção da taxa), a não ser ajudar os Estados Unidos”, disse Gussi.
As importações de etanol anidro pelo Brasil somaram 821 milhões de litros no primeiro semestre, queda de 8,3% ante o mesmo período do ano passado, mas chegaram a atingir 1,8 bilhão de litros/anuais em 2017, segundo informações da reguladora ANP. Conforme dados do governo, o álcool norte-americano respondeu por 90% do total importado pelo Brasil.
O combustível, até agosto de 2017, estava em uma lista de exceção da TEC do Mercosul e tinha tarifa zero. Depois foi aplicada uma cota sem tarifa de 600 milhões de litros/ano, seguida de uma outra cota válida por 12 meses, a partir de setembro de 2019, para 750 milhões de litros/ano.
O setor teme que uma liberalização do mercado possa ameaçar produtores que já sofreram com uma queda de 16,7% nas vendas do etanol hidratado no primeiro semestre, conforme dados da ANP, por conta do impacto da pandemia.
“Estamos defendendo essa tarifa de 20%”, afirmou Gussi, que ressaltou que a indústria conta com apoio do Congresso Nacional para garantir o fim da cota e resistir à pressão dos EUA.
A defesa da tarifa ocorre apesar de ameaças norte-americanas de restrições a exportações de etanol de cana brasileiro, considerado avançado frente ao produto de milho e com mercado na Califórnia.
Segundo o presidente da associação do setor nos EUA, Geoff Cooper, se o Brasil cometer tal “erro”, o seu país deveria considerar medidas similares. Conforme reportagem do jornal O Estado de S.Paulo, o embaixador dos EUA, Todd Chapman, pediu ao Brasil a isenção da tarifa.
Mas o dirigente da Unica, que representa a indústria do centro-sul do Brasil, maior região produtora de açúcar e etanol de cana do mundo, lembrou que, para uma liberalização, os norte-americanos tinham prometido no passado aumento da mistura do biocombustível na gasolina e redução da taxa de importação de açúcar.
“O fato é que não fizeram nenhuma coisa nem outra, eles vêm perdendo mercado para o etanol deles no mundo todo… e aí querem despejar o etanol deles no Brasil?”, questionou.
“Quando o embaixador diz que está trabalhando em longo prazo para a liberalização do comércio, a tendência de livre mercado se aplica também ao açúcar?”, comentou Gussi, ironizando que livre mercado para os EUA parece ter tradução somente “do inglês para o português”.
Para o presidente da Unica, ao invés de ajudar os americanos, isentando tarifas, o Ministério da Economia brasileiro deveria reavaliar ideias que apontam para uma tarifação dos Cbios, créditos de carbono que começaram a ser emitidos este ano pelos produtores de biocombustíveis.
“Tem vozes lá dentro que querem zerar a tarifa para os EUA e tributar em 40% o primeiro ativo ambiental brasileiro”, disse ele. Alguns negócios com Cbios já estão ocorrendo, mas sem uma definição tributária, os acordos ficam mais complicados.
OPORTUNIDADE
Ao mesmo tempo em que teme perda de mercado para o etanol importado, o setor avalia que poderia ter uma oportunidade de avançar frente ao consumo de gasolina no Brasil, após o combustível fóssil passar a ser comercializado com novas especificações, que devem aumentar o rendimento, mas também deixar o produto mais caro.
“A nossa padronização era tão deficitária que permitia a importação de derivados (de petróleo) de baixíssima qualidade…”, disse Gussi.
“O etanol (hidratado) ganha competitividade com uma gasolina mais cara, além de ter todas as suas externalidades ambientais e sociais…”, disse ele, lembrando que o etanol anidro, antes do novo padrão, já ajudava a melhorar a octanagem da gasolina.
Conforme a ANP, o valor mínimo de octanagem RON 92, para a gasolina comum, passou a ser obrigatório a partir deste semana. Ao final de julho, a Petrobras informou que já produz a gasolina com RON 93 que será obrigatória apenas em 2022.
Fonte: Reuters
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