Os grandes consumidores industriais estão otimistas de que o decreto do programa Gás para Empregar poderá aumentar a oferta de gás natural mercado, já que estabelece novas regras para as etapas de escoamento e tratamento do gás, além de definir critérios de precificação e de reinjeção, o que pode estimular o setor. O programa tem sido alvo de fortes críticas do mercado, que viu na minuta do decreto que circulou informalmente a possibilidade de que a ANP intervenha no mercado para exigir das empresas a ampliação da produção do insumo para comercialização. Nesta segunda-feira, o ministro Alexandre Silveira negou que o decreto represente uma intervenção do governo no mercado. O texto foi aprovado na reunião extraordinária do CNPE e é uma promessa que faz parte da agenda política do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e dos ministros Geraldo Alckmin (Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços) e Alexandre Silveira (Minas e Energia), que tenta destravar a oferta do energético à indústria.
O diretor de gás da Abrace, associação que representa os grandes consumidores livres de energia, Adrianno Lorenzon, aponta alguns encaminhamentos importantes, como a reinjeção, acesso a gasodutos de escoamento, processamento terminal de GNL (que o setor chama de infraestrutura essencial) e a participação da EPE na elaboração de um plano integrado de infraestrutura. “Parece que esses são os três principais pilares ali no decreto, além da resolução do CNPE, nos parece que vai focar na questão da PPSA, da forma de comercialização do gás na União. Então juntando o decreto mais a resolução do CNPE [que permite a venda direta de gás natural ao mercado], nos parece que esses seriam os pilares que eles estão tentando atacar”. Segundo Lorenzon, o fato de a ANP poder olhar o plano de desenvolvimento dos produtores e identificar correções de rota é algo natural e previsto. “Não entendo que provoque quebra de contrato ou uma insegurança. Talvez a letra fria cause um certo alvoroço, um receio de que haja uma intervenção muito forte, mas acho que desde o ano passado, desde a criação do Gás para Empregar, esse é um assunto que está sendo discutido publicamente”, acrescenta.
A fala de Lorenzon não é consenso, já que outros especialistas apontam que revisitar os planos de desenvolvimento pode gerar insegurança jurídica, comprometer a confiança dos investidores e afetar a previsibilidade do setor. Segundo o diretor de infraestrutura da Alvarez & Marsal, Rivaldo Moreira Neto, a revisão de planos de desenvolvimento de projetos que tiveram investimentos realizados, inclusive planos já aprovados da ANP anteriormente traz bastante preocupação para o setor. A sócia do Rolim Goulart Cardoso Advogados, Maria João Rolim, pondera que em mercados competitivos têm que se trabalhar numa lógica de mercado, não numa lógica de intervenção de regulação de preço. “A forma mais forte de regular o mercado é regular preço. Aí deixa de ser preço para ser tarifa. O mercado tem que aumentar a competição e tem mecanismos próprios para se adaptar e para refletir também o preço das commodities de uma forma real. Por outro lado, eu entendo o lado do consumidor. Há formas de melhorar as condições para os consumidores mexendo em outros instrumentos regulatórios que permitam fazer com que o preço varie menos (…) Não é mexendo no preço que você vai resolver a questão da volatilidade do mercado que é volátil mesmo”, diz Rolim.
Da mesma maneira, a Coalizão pela Competitividade do Gás Natural Matéria Prima, grupo de entidades que atuam em prol do gás para a indústria, vê o programa como indutor para melhorar a produção, escoamento, processamento, transporte e distribuição do gás natural no Brasil. “O gás natural a preços competitivos e com oferta constante, cria as bases para a o desenvolvimento econômico e sustentável do país, permitindo a descarbonização da economia e contribuindo para a transição energética no setor industrial”, diz André Passos, presidente da Abiquim, entidade que faz parte da coalizão.
Fonte: Valor Online