As medidas para desconcentração do mercado de gás natural, propostas pelo senador Laércio de Oliveira (PP/SE), podem liberar volumes de ao menos 12 produtores que hoje vendem gás para a Petrobras na boca do poço, mas cujos contratos de comercialização poderão ser interrompidos antes do prazo por força de lei.
Oliveira incluiu medidas que alteram regras da indústria de gás natural no relatório do projeto de lei que cria o Programa de Aceleração da Transição Energética (Paten).
Originalmente, o texto aprovado na Câmara dos Deputados cria um fundo de aval para financiamento de projetos nos setores de energia, incluindo o gás natural, e biocombustíveis, além de novas cadeias, como hidrogênio. Ainda está em discussão no Senado Federal.
Pelo texto, contratos vigentes de compra de gás natural de outros produtores e comercializadores, fechados pelo agente com 50% do mercado – a Petrobras –, deverão ser revogados caso ainda não tenham entrado em vigor.
O relatório mira, assim, a compra de gás de terceiros pela companhia e atende aos interesses de consumidores, tanto industriais como as distribuidoras, que atendem o mercado cativo nos estados.
Caso os contratos tenham entrado em vigor, o projeto também prevê uma desconcentração: terá sua quantidade diária contratual reduzida em 50%, no prazo de até 12 meses; e será encerrado em até 24 meses.
Laércio Oliveira foi relator da Lei da Gás, que prevê um mecanismo de concentração da oferta chamado de gas release. No Paten, o senador tenta regular sua execução, mirando a participação de mercado dominante da Petrobras.
Contratos de venda de gás para a Petrobras
Levantamento da agência eixos, com base em dados públicos da ANP mostra que possuem, hoje, contratos de longo prazo com a Petrobras doze produtores e comercializadores de gás natural.
Há ainda outros agentes que possuem contratos em vigor até o fim deste ano (CNODC, Origem Energia, PPSA e TotalEnergies). Virtualmente, não seriam afetados pela proposta.
Não há transparência sobre os volumes envolvidos nesses contratos. Além disso, parte desse volume é consumido nas unidades de processamento.
Os contratos de longo prazo, com vencimento de 2027 até o fim de 2038, foram firmados com: Brava Energia (3R/Enauta); CNOOC, Equinor; Gas Bridge; Geopark; ONGC; Petrogal; PetroReconcavo; Qatar Petroleum; Repsol Sinopec; Shell; e Sonangol.
Acordo com Cade veta compra de gás pela Petrobras, com exceções
A proposta incorpora e amplia um dispositivo já previsto no Termo de Cessação de Conduta (TCC) assinado pela Petrobras em 2019, pelo qual a petroleira se comprometeu junto ao Cade a não contratar novos volumes de gás de terceiros na boca do poço.
O compromisso não impede que a Petrobras celebre novos contratos para compra de gás de parceiros ou terceiros, desde que: Para viabilizar a produção, em si, por razões técnicas, regulatórias ou operacionais, desde que limitado a 1 milhão de m³/dia; Viabilizar a venda de ativos que envolvam a comercialização de até 1 milhão de m³/dia, na média anual, por campo produtor; Ou quando houver interesse das partes envolvidas, para monetização de projetos novos em que a Petrobras seja sócia, desde que limitado a 20% do volume total de gás produzido.
Há contratos, aliás, que foram assinados após o TCC. A Petrobras seguiu liberada para importar, o que faz por meio dos contratos com a Bolívia e terminais de gás natural de liquefeito (GNL) no Rio e na Bahia.
Recentemente, a YPFB ancorou na Petrobras o envio dos volumes de gás natural que a Argentina deixou de comprar da Bolívia a partir de setembro.
A estatal boliviana informou que, a partir de outubro, aumentou as exportações de gás para o Brasil — e que a Petrobras se comprometeu a importar mais volumes.
O capítulo reservado ao fomento da indústria de gás natural apresenta um pacote amplo de políticas de incentivo ao setor.
O relatório do projeto de lei do Paten traz propostas como: fixação de diretrizes para leilões de desconcentração da oferta (gas release); criação de tarifas de transporte diferenciadas para movimentação de curta distância (conhecida, no mercado global, como short haul); estímulos para o uso do gás no transporte pesado; e redução de royalties, dentre outras políticas, para aumento da oferta de gás.
Além disso, incorpora em lei a criação do Comitê de Monitoramento do Setor de Gás Natural (criado pelo Ministério de Minas e Energia por meio de portaria) – e com poder de criar resoluções transitórias enquanto a regulamentação da Lei do Gás não for concluída pela ANP.
O relator também incluiu a produção dos fertilizantes nitrogenados, que usam o gás como matéria-prima, no rol de setores contemplados pelo Paten.
Aprovado na Câmara, ano passado, o PL cria um fundo de aval, batizado de Fundo Verde, com o objetivo de reduzir os custos do financiamento de projetos voltados à produção de combustíveis sustentáveis e geração de energias renováveis.
Ao justificar a inclusão do capítulo do gás, Laércio defende a necessidade de medidas complementares à Lei do Gás, da qual foi relator na Câmara dos Deputados, em 2021.
Fonte: Eixos