Em artigo publicado no portal Jota, o sócio-diretor da Zenergas Consultoria, Zevi Kann, afirma que,
Induzir novos investimentos é uma das essências de uma boa regulação de serviços públicos. O mercado não se realiza por decreto, mas sim com muita rede de distribuição e transporte. No setor de gás natural, regido por monopólios naturais em dois de seus três principais elos da cadeia, temos observado movimentos distintos desde o primeiro marco regulatório do setor, a Lei 11.909, de 4 de março de 2009, o que diz muito sobre a qualidade da regulação. De um lado, o elo de transporte de gás (midstream) praticamente ficou estático, mesmo depois da privatização de duas de suas principais transportadoras, sem que o Brasil tenha visto, ainda, nenhuma revisão das tarifas de ambas ou planos de investimentos significativos para ampliar a malha. O tempo parou: quem costumava ler em 2010 as informações sobre as extensões dos gasodutos de transporte no Brasil, hoje, na leitura, vai imaginar que está com jornal antigo; afinal, continuamos, em 2025, com os pouco mais de 9.000 quilômetros de malha. De outro, o elo de distribuição (downstream) vem crescendo a uma média que varia de 5% a 6% ao ano em seus principais indicadores, como o de extensão de rede, o número de clientes atendidos e volumes contínuos de recursos para expansão de dutos – são muitos os bons exemplos em unidades da federação de diversas regiões do País. Esses investimentos são a parte cheia do copo no mercado de gás brasileiro.
Mesmo sem ainda contar com o apoio de diversas políticas públicas que poderiam incrementar mais o setor, o segmento de distribuição vem fazendo – e bem – a sua função: implantar redes, operá-las, mantê-las e distribuir o gás com qualidade, eficiência e segurança, atendendo consumidores industriais, residenciais, comerciais, veiculares e termelétricas em suas respectivas áreas de concessão. E, principalmente, atraindo novos clientes – fator essencial para ganho de escala, eficiência e modicidade tarifária no médio e longo prazos de forma sustentável. Para desenvolver o mercado, a boa regulação tem nas revisões tarifárias um momento privilegiado. É nesse momento que as concessionárias apresentam seus planos de negócios, descrevendo e justificando os investimentos que pretendem fazer e as despesas necessárias para que possam dar conta da operação e do atendimento ao cliente com qualidade. A propósito: os usuários de gás canalizado frequentemente passam décadas sem qualquer tipo de interrupção nos serviços. Mas cada vez mais as concessionárias necessitam investimentos, modernização de seus sistemas e planos de manutenção para que as metas sejam atingidas com resiliência, inclusive para resistir a condições climáticas cada vez mais extremas.
É desnecessário relembrar casos em que a população foi duramente afetada por falta de investimentos preventivos em robustez da segurança operacional e da modernização de processos e sistemas de tecnologia. Daí a importância dos planos de negócios estruturados, em que as concessionárias apresentem metas com entregas definidas, com recursos bem alocados e aplicação sob permanente fiscalização.
É nas revisões tarifárias que o regulador tem a oportunidade de lançar um olhar para o futuro. Isso fica claro no Espírito Santo. Depois de um longo período de incertezas, o Poder Concedente soube conduzir um exitoso processo de licitação e trouxe novo controlador para a ES Gás. O resultado é inequívoco: o plano de negócios apresentado pela ES Gás para o segundo ciclo regulatório, com início em agosto de 2025 e término em 31 de julho de 2030, ora em consulta pública, vai nessa direção. Do volume de R$1 bilhão previsto em investimento pela ES Gás, cerca de R$230 milhões são propostos para aumentar a resiliência do sistema de fornecimento de gás natural e biometano. O Plano de Negócios da concessionária propõe a expansão do gás canalizado no estado do Espírito Santo para 270 mil usuários em 2030, número que beneficia uma população de cerca de 1 milhão de pessoas. Esse reforço também envolve saltos tecnológicos. Lembremos que, apesar de ser um monopólio natural, o mercado de gás canalizado enfrenta forte concorrência de outros energéticos – eletricidade, biomassa, GLP (gás de botijão), entre outros. E é necessário observar permanentemente a tradição de referência na comparação do padrão de atendimento, tecnologia e inovação em relação a outros setores concorrenciais. Na revisão tarifária é definida a margem da distribuidora, esse recurso corresponde em média a 18% do total da tarifa paga pelos usuários – o restante equivale ao preço da molécula de gás e seu transporte e a carga tributária. Esse valor remunera a concessionária que em contrapartida deve implantar novas redes, expandir o número de usuários e operar todo o sistema de distribuição atendendo às exigências regulatórias de segurança e qualidade. Para tanto, esse recurso se destina também aos pagamentos de todos os funcionários, colaboradores e fornecedores de materiais e serviços.
A metodologia price-cap adotada pelo estado do Espírito Santo e aplicada pela Agência de Regulação de Serviços Públicos do Espírito Santo estabelece de forma pública e transparente todos os parâmetros necessários a uma operação eficiente e de qualidade da distribuidora. Para se tornar uma referência no mercado de gás, portanto, o Espírito Santo tem o desafio de combinar todas as variáveis para estabelecer uma matriz energética segura, robusta e diversificada, promovendo a descarbonização com a integração de gás natural e biometano, e a competitividade, impulsionando o desenvolvimento econômico e sustentável de todo o estado. O mercado de gás natural e biometano exige para sua evolução uma forte atração de investimentos. Com a garantia desses recursos, é uma questão de trabalhar e confiar, como inspira a própria bandeira do estado.
Fonte: Portal Jota – Zevi Kann
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