O Brasil poderia ampliar a geração de eletricidade a partir do gás produzido do lixo doméstico, mas a falta de incentivos limita a expansão dessa fonte de energia. A opinião é de Renata Isfer, presidente da ABiogás, para quem os benefícios concedidos atualmente às fontes eólica e solar tornam a energia renovável produzida por essas matrizes mais competitiva. “Grandes aterros estão abandonando a geração de eletricidade porque não valorizam todos os seus atributos”, afirma a executiva. “Ninguém vai fazer investimento sem saber se vai conseguir vender a energia”, acrescenta. A executiva defende que o biogás tem o diferencial de fornecer energia elétrica de forma constante e segura, inclusive nos horários de pico, ao contrário de fontes intermitentes, caso da eólica, que não gera quando não há ventos, e a solar, que para de produzir quando anoitece. Hoje, segundo a Associação Brasileira de Resíduos e Meio Ambiente (Abrema), 300 MW de eletricidade são gerados nos aterros sanitários no país. Mas seria possível ampliar essa produção em pelo menos 30%. Há 147 plantas de biogás para produção de biometano e energia elétrica em operação, de acordo com ABiogás. Desse total, pouco mais de 50% geram energia elétrica. A Abrema calcula que o Brasil produz 81 milhões de toneladas de resíduos sólidos urbanos (RSU) por ano, dos quais 41% são depositados irregularmente em lixões sem nenhuma utilidade. O restante é encaminhado à reciclagem, transformado em compostagem para adubo ou disposto em aterros sanitários. São nesses aterros que se produz o biogás para geração de eletricidade ou biometano, a partir da decomposição acelerada de resíduos orgânicos coletados. Também é possível produzir eletricidade a partir da queima, em caldeiras, dos resíduos não recicláveis (orgânicos e inorgânicos). É a chamada unidade de recuperação energética (URE), popularizada na Europa na segunda metade do século passado. Atualmente, há pelo menos 500 delas em atividade no continente; a China tem o dobro.
O Plano Nacional de Resíduos Sólidos prevê que, até 2040, 15% dos resíduos urbanos sejam destinados a UREs, o que representaria 994 MW de potência instalada de geração de energia, suficiente para abastecer 27 milhões de domicílios com eletricidade. Até agora, porém, só há uma unidade em construção e com energia já contratada, em Barueri, na região metropolitana de São Paulo, com capacidade prevista para produzir 20 MW de energia. O projeto, o primeiro desse tipo no Brasil e na América Latina, saiu do papel em 2021, quando um leilão de energia elétrica contratou pela primeira vez a fonte de resíduos sólidos. O investimento alcança R$ 550 milhões, sendo 80% da Orizon, empresa encarregada da operação, e 20% da Sabesp. A planta deve começar a operar até 2027, com resíduos coletados de municípios como Barueri, Carapicuíba e Santana de Parnaíba, também na Grande São Paulo. Serão cerca de 870 toneladas por dia. Só Barueri, segundo a prefeitura, gera diariamente cerca de 300 toneladas de resíduos. O contrato de concessão da coleta de lixo da capital paulista prevê a construção de duas UREs, com 30 MW cada e início da operação em 2028, mas as duas unidades estão ainda em fase de licenciamento ambiental.
“Falta incentivo do governo federal com leilões de compra de energia que paguem um preço justo pela fonte”, diz Yuri Schmitke, presidente da Associação Brasileira de Energia de Resíduos (Abren), sobre a lenta expansão da tecnologia no país. Segundo especialistas, esse tipo de projeto é adequado para locais densamente povoados e com restrições de disposição de resíduos. A Abren calcula que os resíduos sólidos das 28 regiões metropolitanas do Brasil com mais de 1 milhão de habitantes são capazes de gerar 3,3 GW em energia, com investimentos somados de R$ 181 bilhões em UREs. Assim como a ABiogás, a associação também reforça a energia gerada de RSU como fonte segura de fornecimento de energia. Erik Rego, vice-coordenador do Centro de Inovação para Transição Energética da Poli-USP, vê o índice de aproveitamento energético ainda baixo de RSU, mas acha essencial apostar na fonte de energia. É possível, na opinião dele, haver ganhos econômicos a partir dos resíduos sólidos urbanos. “Além disso, é importante dar um destino ao lixo, que já está perto do limite de alocação em muitos lugares”, afirma.
Fonte: Valor Econômico / Especial Energia & tecnologia
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