Maurício Bähr e Matheus Amorim, da GDF Suez, falam dos planos da empresa após adquirir áreas exploratórias de gás natural no Brasil
Com blocos de exploração nas bacias do Recôncavo (BA) e do Parnaíba (MA), a francesa GDF Suez estreia no setor brasileiro de óleo e gás apostando em geração térmica. A controladora da Tractebel Energia, que tem em seu portfólio ativos de óleo e gás em diferentes fases de desenvolvimento em outros continentes, já estudava entrar no setor de exploração brasileiro pelo menos dois anos antes da realização da 12ª rodada da ANP, revela o presidente da companhia no Brasil, Maurício Bähr. Na prática, isso significa que a companhia não entra de “peito aberto” no segmento de exploração e produção, diz o vice-presidente de Novos Negócios do grupo, Matheus Amorim. Nesta entrevista exclusiva à Brasil Energia, os executivos falam sobre as expectativas com o novo segmento e futuras estratégias de geração no país, que envolvem a continuidade nos investimentos em eólicas e maior aporte de recursos em cogeração a bagaço de cana.
Qual é a estratégia da GDF Suez para os investimentos em E&P no Brasil?
Maurício Bähr: Não é um segmento novo para nós, mas sim outro país no qual estamos entrando. O grande estímulo para entrar nessa área no Brasil era justamente já termos uma geradora de energia, que, associada ao momento que o Brasil está vivendo com a falta de reservatórios e a necessidade de gerar mais energia termelétrica, cria uma complementaridade interessante. O Brasil precisa de mais gás. Hoje importamos da Bolívia, ajudando a fechar nosso balanço. Com a demanda tanto das indústrias quanto da geração térmica crescendo, encontramos uma oportunidade de replicar o que já fazemos no exterior. Se tivermos sucesso, tão logo achemos esse gás podemos desenvolver projetos que ajudem a monetizá-lo, antes mesmo do fortalecimento de um mercado industrial para o gás.
No exterior, a GDF já destina o gás para geração?
MB: Em cada lugar temos uma atuação distinta. Em alguns países geramos, em outros usamos o gás e até o vendemos para a indústria. Em alguns já tivemos distribuidoras de gás.
A ideia aqui também é variar o uso?
MB: O primeiro uso do gás será para geração. A infraestrutura de gasodutos no Brasil ainda está no seu estágio inicial, não temos um mercado onde é fácil transportar o gás, como nos Estados Unidos.
Mas na Bacia do Recôncavo há infraestrutura. Ainda assim, a estratégia é gerar energia?
MB: Quando começamos a avaliar o mercado aqui no Brasil, há uns dois anos, trouxemos uma geóloga do grupo para estudar as diversas bacias. A ideia era fazer um tipo de lista de bacias prioritárias. O Recôncavo caiu no primeiro grupo de prioridades, justamente por já ser uma bacia conhecida, com infraestrutura. Assim, abre a possibilidade de não só usar gás para energia elétrica, mas também para a indústria local. Isso, porém, não afastou nosso interesse de ir para outras bacias. Também entramos no Parnaíba, comprando os ativos que a Vale tinha em dois blocos. E talvez numa próxima oportunidade consideremos outras bacias.
O projeto térmico seria na Bahia mesmo?
MB: Ainda não temos um local licenciado. Vamos começar essa avaliação a partir de agora. A ideia é fazer esse estudo em paralelo à tentativa de achar o gás.
Já existem no portfólio da GDF Suez projetos de geração que possam receber esse gás?
MB: Nada pronto. O único projeto que temos gerando a gás no Brasil é uma térmica pequena (William Arjona, 190 MW) em Campo Grande (MS), que consome basicamente o gás natural que vem da Bolívia. Não temos nada de maior porte. A Tractebel tem hoje todas as fontes, só falta a nuclear, que aqui no Brasil não é possível. Temos até experiência no resto do mundo, acabamos de ganhar contrato na Turquia para entregar três usinas nucleares. Nosso objetivo é que um dia possamos fazer parte desse processo aqui no Brasil, quando for viável que o setor privado contribua.
Há estudos para aquisição de projetos térmicos?
MB: Vamos tentar desenvolver a partir do zero. Essa é nossa ideia.
A empresa arrematou tudo o que pretendia no leilão da ANP?
Matheus Amorim: Nós nos preparamos para seis blocos e ganhamos os seis.
Pelo contrato de concessão, são cinco anos de exploração e mais cinco até a declaração de comercialidade. Como é no Recôncavo, pode ser antes?
MA: Pode ser um pouco antes disso, mas tudo depende do resultado exploratório. É claro que quando se entra em um projeto como esse o objetivo é fazer tudo o mais rápido possível para monetizá-lo mais rapidamente. Afinal, lá existe infraestrutura. Na Bacia do Paraná, mesmo encontrando gás, é mais complicado, pela ausência de infraestrutura. É claro que talvez seja possível achar até mais gás no Paraná, pelo tamanho dos blocos e outros fatores. No Recôncavo, porém, a infraestrutura é um ponto positivo que acelera a possibilidade da monetização.
Mas quando?
MB: Médio prazo. Diferente de uma hidrelétrica que vai ser leiloada agora e em quatro anos fica pronta, primeiro vamos ter de achar o combustível e, nesse meio tempo, encontrar um terreno, licenciá-lo… Antes de cinco anos não vai acontecer nada.
MA: Tudo tem um prazo. O licenciamento ambiental de uma hidrelétrica, por exemplo, tem seu próprio timing. Não queremos achar gás, declarar comercialidade e só depois começar a fazer o licenciamento.
MB: Vamos investir nesse trabalho em paralelo. Para, no momento em que acharmos gás, já termos uma opção.
Com sucesso exploratório, dois anos é um prazo razoável para declarar comercialidade. Já existe uma térmica projetada?
MB: O projeto já está sendo iniciado e estamos estudando térmicas em outros lugares, não só ligadas a potenciais reservas. Acredito que no futuro tenhamos até a possibilidade de fazer swap de gás, entregar no Norte e receber no Sul. Acreditamos que vai haver uma evolução natural desse mercado.
Como foi negociar com a Petrobras a formação do consórcio?
MB: Foi normal. Nessa área, parceria é algo muito comum. O grau de risco no ambiente de exploração é tão maior que temos de pulverizar, ter sócios. É uma cultura. Criar essa associação é muito mais difícil no setor elétrico. Em óleo e gás isso é premissa básica. Estão todos já preparados, com seus acordos de prateleira.
A GDF Suez pode vir a ser operadora no Brasil também?
MB: Aqui fomos qualificados pela ANP como operador B. Então, poderíamos.
MA: No começo, a ideia é se associar. No caso da Petrobras, por exemplo, para aprender um pouco com eles. Não chegar querendo ser operador, ser a rainha da festa.
A Petrobras também tem interesse em destinar o gás às distribuidoras?
MB: Com certeza. De início cada um dos sócios vai ter gás na proporção de seu investimento, mas não descartaria estudar associações para monetizar o combustível.
O que torna o Brasil atraente em relação a outras partes do mundo?
MB: Talvez se não tivéssemos a Tractebel aqui, com capacidade de entender o setor elétrico a ponto de ter conforto, não teríamos entrado. Porque se achássemos gás e não tivéssemos o que fazer com ele aqui no Brasil seria um problema. Nós do setor elétrico damos conforto para que haja interesse do setor de E&P em achar gás. Quando se acha óleo é fácil de vender. Gás está sempre restrito a infraestrutura e consumo interno.
Que sinal houve de que o preço do gás viabilizará uma térmica?
MB: O que nos dá essa esperança não é um cálculo científico do tipo “o retorno será tanto, porque o preço será tal”. Não temos essa equação montada. O que temos é a visão de que o Brasil vai precisar introduzir geração térmica na sua matriz para fazer frente à situação que está vivendo hoje, que é a falta de reservatórios. À medida que as novas hidrelétricas forem introduzidas no sistema sem nova capacidade de armazenar água, aumenta a dependência de geração térmica na base. Com novas hidrelétricas a fio d’água não teremos capacidade de reservar. Vai haver energia de baixo custo, mas é preciso ter a certeza de suprimento. Aí essa energia, seja ela nuclear, a gás, a carvão, será necessária.
Então a intenção é destinar energia ao mercado cativo?
MB: Nossa esperança é que sejam promovidos, num futuro próximo, leilões específicos fomentando esse tipo de fonte, para que haja equilíbrio no suprimento. Quando se introduz eólica, que é uma energia intermitente, é necessário um pouco mais de segurança. Acreditamos que a EPE promova leilões específicos, talvez regionais, para térmicas, que possam ajudar nesse equilíbrio energético. Vamos continuar atacando o mercado livre, mas os leilões vão ser importantes para viabilizar as térmicas. Sem eles não dá para desenvolver térmicas no Brasil, pois não é viável. Há experiência em países mais desenvolvidos onde essas configurações não se mostraram positivas. O Brasil tem um modelo muito bom, com contratos de longo prazo. Com 70% para o mercado cativo, por exemplo, já é suficiente para viabilizar os projetos. Com financiamento do BNDES, contratos de longo prazo, temos uma equação equilibrada e atratividade suficiente. Precisamos, contudo, de algum tipo de refinamento no modelo, não somente no lado de prever o despacho, mas também de haver uma regra de despacho que crie atratividade, nos corretos níveis de preço e parâmetros do leilão. Isso ainda não se mostrou. O foco hoje é mais desenvolvimento das hidrelétricas.
E aquisições de projetos de geração?
MB: É algo que temos sempre em vista. É natural. Há oportunidades com algumas empresas que desejam sair de alguns ativos que não são seu core business, e isso está sendo avaliado. Mas não podemos divulgar agora.
E a ampliação de energia complementar?
MB: Vamos anunciar em breve algo na área de biomassa de cana. Vamos entrar em cogeração. Está quase definido. Daqui a mais umas semanas, espero, o conselho deve aprovar. Em eólica, estamos desenvolvendo projetos na Bahia e no Ceará. Está bem diversificado o nosso parque de geração.
Porque, até o gás chegar…
MB: O gás é a médio prazo. Curto prazo é (a UHE) Jirau. E longo prazo é nuclear. O portfólio vai crescer em eólica e biomassa, mas são projetos que vão sempre ser desenvolvidos e, de vez em quando, vem um grande projeto que ocupa capital, recurso humano, dedicação. Jirau está consumindo bastante desses recursos, mas devemos atingir a plena capacidade em 2015, e aí termina essa fase de grande alocação de capital.
E quanto a energia solar?
MB: São diversos sites de pesquisa, em regiões diferentes. Queremos testar diferentes tecnologias. Estamos fazendo testes em Santa Catarina, no Rio de Janeiro, no Ceará, em Rondônia. Queremos ver qual se adapta melhor a cada um desses lugares.
A fonte solar ainda não é viável?
MB: Está começando a ser um foco nosso. Os preços de geração ainda são muito altos, e precisamos encontrar uma forma de introduzir a fonte. Vai requerer muita área de exposição para o sol, e os equipamentos ainda estão caros. Estamos estudando.
Fonte: Revista Brasil Energia
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