Quando questionada sobre como foi o ano de 2013 na área sucroalcooleira, a presidente da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica), Elizabeth Farina, não hesita: segundo ela, mais uma vez o segmento financiou o equilíbrio do abastecimento de combustíveis no país. A dirigente se refere ao fato de que, a despeito de o controle de preços da gasolina exercido pelo governo ter continuado a prejudicar o etanol, a produção doméstica dessa alternativa renovável aumentou 17% na safra 2013/14 no Centro-Sul, o que serviu para reduzir as importações do “rival” fóssil por parte da Petrobras.
Nos cálculos da Unica, a produção de etanol na região foi 4 bilhões de litros superior ao volume observado no ciclo 2012/13, o que permitiu à estatal deixar de trazer do exterior cerca de 3,5 bilhões de litros de gasolina. Portanto, afirma Elizabeth, 2013 foi um ano “paradoxal”. A produção de etanol bateu um novo recorde e trouxe esse efeito positivo para o equilíbrio do mercado brasileiro de combustíveis, mas o resultado econômico das usinas foi “muito decepcionante”. “Não é um ano que pode servir de referência como estimulador de investimentos”, diz ela.
Elizabeth reconhece que houve avanços nos benefícios concedidos pelo governo federal. A começar pela isenção de PIS/Cofins sobre ao etanol, o que significou um impacto de R$ 0,12 por litro. Esse valor não foi todo absorvido pelas empresas do segmentos e parte dele foi repassado ao preço do litro pago pelo consumidor final nos postos, o que serviu de alavanca para um crescimento do consumo de aproximadamente 16% em 2013/14, na medida em que tornou o etanol mais competitivo que a gasolina em Estados importantes como São Paulo.
Mas, de acordo com a presidente da Unica, ainda há uma pendência importante na questão do PIS/Cofins a ser resolvida por Brasília. “A desoneração ocorreu, mas ainda não foram publicados o decreto e a instrução normativa que autorizam o uso de créditos de PIS/Cofins pela indústria”, diz Elizabeth Farina.
Em 2014, a Unica também concentrará esforços para que o governo abrace a ideia de incentivar o aumento da eficiência dos motores com a utilização de etanol. Em média, os veículos rodam com o bicombustível com uma eficiência equivalente a 70% da proporcionada pela gasolina. É esse fator que, na prática, faz com que o etanol tenha que custar 70% do valor cobrado pela gasolina para manter sua competitividade econômica em relação ao concorrente. “Aumentar a eficiência dos motores com o biocombustível vai alterar essa relação de competitividade”, afirma.
Ao mesmo tempo em que pleiteia mais apoio, a Unica está preocupada com a possibilidade de o governo federal pôr fim às taxas de juros subsidiadas em linhas de financiamento direcionadas ao segmento, como as que servem para estimular a estocagem de etanol e o plantio de canaviais, além de aportes em pesquisas. Mas o “calcanhar de aquiles” da atividade ainda é o mesmo: a falta de previsibilidade na formação dos preços do combustível no Brasil. Nesse sentido, diz Elizabeth, a interlocução com o governo foi intensa em 2013, mas não resultou em um conjunto de medidas concretas capazes de incentivar investimentos.
A presidente da Unica demonstra até alguma resignação diante da resistência de Brasília em autorizar reajustes automáticos da gasolina. “É claro que o governo tem prioridades, como o controle da inflação. E o meio ambiente não vai se sobrepor à política econômica”. Ela considera, no entanto, que será muito “triste” se o governo não for bem-sucedido na seara econômica. “Se isso acontecer, a inflação não terá sido combatida e a política de energia não terá sido feita, com efeitos muito negativos para uma empresa importante como a Petrobras e para o etanol”.
De qualquer forma – e desconsiderando as urgências macroeconômicas do governo -, o fato é que a Unica não acredita que a energia renovável até agora tenha tido a devida atenção do governo Dilma. O que, de certa forma, foi decepcionante, uma vez que na gestão do ex-presidente Lula o apoio era mais claro. “A gente não sente que é prioridade dentro do governo. Se fosse assim, outras decisões teriam sido tomadas antes. A questão da inflação é relativamente recente. Não foi sempre assim”, diz ela.
De acordo com Elizabeth, a Unica admite que o empresário precisa buscar ser competitivo, com redução de custos, investimentos em pesquisa e desenvolvimento. “Mas ele também precisa ter condições de determinar o preço do seu próprio produto”.
Neste ano, a Unica continuará batendo na tecla de que a Contribuição de Intervenção do Domínio Econômico (Cide) sobre a gasolina precisa voltar. O imposto foi sendo retirado nos últimos dois anos para amenizar os reflexos inflacionários dos reajustes da gasolina nas refinarias. Essa diferenciação tributária, observa Elizabeth, pode ser utilizada para dar oferecer mais competitividade ao etanol.
“Há um combustível fóssil que gera custos relacionados à poluição que não estão no preço de bomba. Da mesma forma, temos o etanol, que emite menos poluição e cujo preço na bomba também não reflete esse benefício. Essa diferenciação tributária funciona como mecanismo para reconhecer atributos que estão escondidos”. A presidente da Unica lembra que o etanol em São Paulo é mais competitivo que em outros Estados porque há uma distinção tributária. “O ICMS da gasolina em São Paulo é de 25% e o do etanol, de 12%”.
As dificuldades do segmento sucroalcooleiro, que se arrastam desde 2008 e geraram um endividamento que já superou o faturamento das usinas, é reflexo de uma crise financeira global que nada tinha a ver com mercado de etanol, explica Elizabeth. Com isso, o endividamento cresceu e os mercados nos Estados Unidos e na Europa encolheram. “Antes, acreditava-se que a economia verde ia revigorar a força econômica da Europa. Hoje, pensa-se três vezes antes de se falar isso”.
Ocorre que o Brasil, afirma a presidente da Unica, optou por uma política que não reduzisse a atividade econômica do país aos níveis do que estava ocorrendo nos Estados Unidos e na Europa. E uma das medidas foi a redução do IPI dos automóveis, o que aumentou a demanda por veículos e, consequentemente, por combustíveis. “A primeira preocupação com os preços dos combustíveis nasce com essa reação à crise financeira”.
Como 2014 é ano de eleição, Elizabeth afirma que será importante para a Unica ouvir a visão de cada candidato à Presidência sobre a política energética para o país. “Será que para uma eventual segunda gestão [da presidente Dilma] estaremos dentro das prioridades? Se sim, quais serão as medidas concretas? Qual o papel que se espera que o etanol cumpra na matriz energética?”. Ela diz que a rodada de conversas com pré-candidatos ainda foi iniciada. “Mas vamos indagar todos quanto a essas demandas, que também incluem a eletricidade produzida pelas usinas a partir do bagaço da cana”.
Fonte: Valor Online
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