Sem enxergar possibilidade de aprovar neste ano o Projeto de Lei 6407, que trata da desverticalização do setor de gás natural, o governo federal iniciou na semana passada discussões com a Agência Nacional do Petróleo (ANP) para mapear soluções infralegais, que não demandam nova lei ou alteração legal e possam ser adotadas para destravar investimentos e aumentar a concorrência.
Criado na esteira da venda de ativos da Petrobras e em discussão no Congresso, o PL enfrenta resistências de Estados contra mudanças nas legislações estaduais da área.
“Queremos construir convergências com a agência e as discussões públicas lançadas recentemente podem contribuir para mapearmos o que pode ser feito ainda esse ano”, diz Symone Araújo, diretora de gás do Ministério de Minas e Energia. Em outubro, a ANP lançará uma consulta pública para colher sugestões sobre o acesso à infraestrutura de escoamento de gasodutos, Unidades de Processamento de Gás Natural (UGPNs) e terminais de regaseificação de Gás Natural Liqueifeito. O livre acesso é um dos pontos defendidos por grandes consumidores e novos investidores para ganhar espaço na cadeia, na qual a Petrobras participa de todos os elos.
Recentemente a ANP também fez uma consulta sobre o processo de substituição do GNL por gás natural nacional em contratos firmados quando o insumo nacional estiver disponível para contratação. Outra chamada, lançada em setembro, está vinculada à Transportadora Brasileira Gasoduto Bolívia-Brasil (TBG) e se refere à contratação do gasoduto, que hoje transporta cerca de 30 milhões de metros cúbicos por dia do insumo boliviano ao Brasil.
O contrato da TBG é de 18 milhões de metros cúbicos por dia, cerca de 7% do volume contratado no mercado, estimado em 260 milhões de metros cúbicos diários. A chamada deverá ser encerrada em julho de 2019. Será adotado o sistema de entrada e saída, em vez de ponto a ponto. “Essa chamada do Gasbol será um bom teste para avaliar o modelo de entrada e saída do gás e servirá como um termômetro para avaliar o interesse de outros agentes no setor – há expectativa de interesse de empresas que podem movimentar o gás”, diz Symone. O contrato da Petrobras com o governo boliviano expira em 31 de dezembro de 2019. A estatal ainda não informou qual será sua estratégia. Symone esteve em julho na Bolívia. “Essas chamadas são oportunidade de colocar o assunto para a sociedade brasileira de forma transparente”, diz o diretor-geral da ANP, Décio Odone.
A chamada pública do Gasbol é considerada um marco por abrir a possibilidade de outros agentes além da Petrobras mostrarem interesse em carregar e comercializar esse gás, mas isso é visto por ceticismo por algumas indústrias consumidoras de gás. Por falta de investimentos nos últimos dez anos, a Bolívia pode ter perdido capacidade de manter a exportação de volumes de 30 milhões de metros cúbicos diários no longo prazo.
Uma das maiores consumidoras de gás do país trabalha com projeção de que a Bolívia possa enviar cerca de 15 milhões de metros cúbicos por dia, quantidade que poderá ficar totalmente nas mãos da Petrobras. O industrial também vê com ceticismo a possibilidade de o governo avançar em três meses com medidas infralegais. “Talvez haja a possibilidade de mudar o modelo de ponto a ponto para entrada e saída”, destaca.
Sócios da Ecom Energia, que obteve autorização para comercializar gás da Agência Nacional do Petróleo (ANP), viajaram à Bolívia nos últimos dois anos, com intenção de comercializar volumes pequenos de 100 mil metros cúbicos/dia, mas desistiram. “O mercado de gás natural tem muitas incógnitas ainda”, diz Paulo Toledo, sócio da ecom energia.
Hoje o gás natural é contratado a partir de um modelo de capacidade ponto a ponto em gasodutos de transporte. Um agente que contrata uma quantidade de moléculas de gás que atravessa mais de um Estado tem de fazer contrato trecho a trecho nos gasodutos, sendo cobrado mais de uma vez. O gás injetado e retirado em uma mesma área geográfica tem uma
determinada tarifa. Em outra área geográfica, as tarifas são diferentes. Já no sistema de entrada e saída as empresas ganham mais flexibilidade. Ao separar a contratação da entrada e saída, o sistema automaticamente cria um produto homogêneo que pode ser negociado em termos iguais por todos os agentes da indústria.
Para Marcelo Cruz Lopes, gerente executivo de gás natural da Petrobras, é essencial prestar atenção ao sequenciamento das medidas a serem aplicadas na indústria, para evitar que, em vez de ajudar, o ordenamento incorreto prejudique a abertura. “O modelo de entrada e saída deve ser visto antes de outros; ele pode oferecer liquidez, mas também será preciso ver a questão da tributação. A prioridade a esse modelo de entrada e saída dispensa mudança legal”, observa o executivo da Petrobras.
Fonte: Valor Econômico
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