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Queda no preço do gás depende do fim dos monopólios, diz setor

Petrobras domina desde o processamento até a comercialização

A expansão do mercado de gás natural no Brasil e a queda dos preços passarão necessariamente pelo fim de monopólios —desde a produção até o transporte ao consumidor—, avaliam especialistas da área.

“O potencial de desenvolvimento do setor é enorme. Poderia ser duplicado caso indústrias e usinas térmicas trocassem fontes como óleo diesel e carvão pelo gás”, avalia Augusto Salomon, presidente-executivo da Abegás (Associação das Distribuidoras de Gás Canalizado).

Para isso, porém, seria preciso uma vasta reforma no mercado, para reduzir os custos, desenvolver a infraestrutura de transporte e aprimorar a regulação.

O governo de Jair Bolsonaro já sinalizou que, até junho, vai anunciar quais medidas pretende adotar para alterar o marco legal do setor. O ministro da Economia, Paulo Guedes, chegou a dizer que as mudanças promovidas provocariam uma redução de 50% no custo do gás.

O setor aguarda com ansiedade o anúncio desse pacote, até agora pouco conhecido por associações, empresas e analistas da área. Entre eles, há um consenso: a queda dos preços implicará o fim do monopólio da Petrobras no setor.

A estatal ainda é responsável por praticamente toda a cadeia. Embora haja outros produtores no país —caso das companhias internacionais que venceram os últimos leilões de exploração de petróleo—, a comercialização é feita pela petroleira.

“As outras empresas produtoras acabam vendendo seu gás à Petrobras por não ter acesso garantido aos gasodutos”, diz Salomon.

A estatal brasileira domina praticamente todo o caminho do gás até chegar ao consumidor: o processamento, quase toda a rede de gasodutos e a comercialização às distribuidoras estaduais de gás —a maioria com participação acionária da Petrobras.

“O mercado brasileiro se estruturou sem competição. A Petrobras comanda a oferta primária, opera o caminho do gás e ainda é parte do mercado consumidor. Então o preço alto que temos hoje no país é resultado da atuação de um monopolista em um mercado regulado”, afirma Rivaldo Moreira Neto, sócio da consultoria Gas Energy.

A saída da estatal do segmento de transporte de gás já está em curso desde 2016. Naquele ano, a empresa vendeu a rede de gasodutos da NTS (Nova Transportadora do Sudeste) ao fundo canadense Brookfield, embora ainda mantenha 10% das ações.

A venda da TAG (Transportadora Associada de Gás) —cujos gasodutos passam pelo Sudeste, Nordeste e Norte— também está em vias de se concretizar. No dia 5 deste mês, o grupo francês Engie e o fundo canadense Caisse de Dépôt et Placement du Québec apresentaram a melhor proposta para comprar 90% da TAG, por US$ 8,6 bilhões (R$ 33,5 milhões).

“As desestatizações são um avanço importante, mas não resolvem o problema totalmente, já que a Petrobras ainda mantém contratos que lhe garantem o direito de usar a estrutura”, afirma o advogado Giovani Loss, sócio do escritório Mattos Filho.

“As vendas dos ativos permitem um descasamento entre o carregador [quem coloca o gás no duto] e o dono do gasoduto. Mas sem que várias empresas possam colocar seu gás na rede, não se resolve a questão”, acrescenta.

Uma mudança de regras que permita que outras companhias tenham passagem garantida pela rede de transporte é essencial para o barateamento do produto, avalia Salomon, da Abegás. “Queremos poder comprar de outras produtoras. Com mais competição, cai o preço.”

As próprias distribuidoras estaduais também são alvo de questionamentos, pois detêm o monopólio da distribuição do gás até os consumidores em seus estados.

Para Rivaldo Neto, da Gas Energy, embora a tarifa cobrada pelas distribuidoras represente uma parte menor do preço final do gás, há formas de dar mais eficiência às companhias.

Para ele, o grande problema, neste caso, é que as distribuidoras são reguladas localmente. Porém quase nenhum estado do país tem agências reguladoras fortes e independentes, faltando uma fiscalização eficiente às companhias.

“O consumidor ficou à mercê da regulação local. Há muitas falhas. Até São Paulo, que tem uma agência reguladora mais desenvolvida, tem problemas na hora de fazer a revisão das tarifas.”

Já na visão de Loss, do Mattos Filho, a solução passa pela criação de um mercado de gás natural livre, para que os consumidores não precisem comprar necessariamente das distribuidoras e possam escolher seu fornecedor.

“Atualmente, só a distribuidora pode comprar o gás que chega aos estados. Se houver disponibilidade na sua rede, outras empresas poderiam utilizá-la para vender ao consumidor final”, afirma.

Essa abertura, diz ele, faria com que o setor de gás se assemelhasse ao mercado livre de energia elétrica —bem mais desenvolvido, esse mercado é utilizado por quase todas as grandes indústrias do país, que conseguem reduzir seus gastos com energia elétrica e ganhar competitividade.

“Todos esses entraves são antigos. Mas há dois fatores que tornam o atual governo um momento chave para uma reforma mais drástica”, diz Antonio Guimarães, secretário-executivo do IBP (Instituto Brasileiro de Petróleo, Gás e Biocombustíveis).

O primeiro deles é a real disposição por parte da Petrobras de abrir mão de seu monopólio nos vários segmentos.

Procurada pela reportagem, a estatal afirmou, por meio de uma nota, que atua ativamente em prol da abertura do mercado de gás no Brasil.

“Estimular a abertura do mercado e a presença de vários atores construirá um mercado competitivo e mais benéfico para a economia brasileira e para os agentes envolvidos”, afirmou a empresa.

O segundo fator que torna uma reforma propícia neste momento é o início da exploração dos campos do pré-sal, avalia Guimarães.

“Teremos uma quantidade enorme de gás natural associada ao pré-sal. Sem uma regulação adequada, há o risco de o Brasil não se apropriar dos benefícios desse gás. Hoje, muitas empresas que já poderiam estar comercializando o produto não o estão fazendo por falta de regulação. É preciso aproveitar essa oferta”, afirma ele.

Em relação à estimativa do ministro Guedes de que seria possível reduzir em 50% o custo do gás, o secretário do IBP diz não ter uma avaliação. “Mas que a competição traz o preço para baixo, disso não tenho dúvidas.”

Fonte: Folha de São Paulo

 

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