Em apenas um ano, até julho de 2021, o preço do gás de botijão já subiu quase 30% (29,44%), segundo o INPC, que mede a inflação para as famílias com renda mensal entre um e cinco salários mínimos. A alta foi de quase três vezes a registrada pelo índice geral em igual período (9,85%). Com isso, o peso do gás de cozinha no cálculo da inflação passou de 1,56% em agosto de 2020 para 1,79% em julho de 2021. Em quatro das dez regiões metropolitanas pesquisadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) o peso já ultrapassa os 2%. Pelo cálculo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), chega a 2,7% nas famílias com renda muito baixa (renda domiciliar menor que R$ 1.650,50 por mês).
O movimento de alta dos preços do gás de botijão acompanha o aumento do preço do gás liquefeito de petróleo (GLP) da Petrobras. Em meio à valorização do petróleo no mercado internacional, a estatal brasileira já reajustou o derivado seis vezes este ano, uma alta acumulada de 37,8% em 2021.
A pressão no orçamento das famílias tem atraído a atenção de políticos. Nas últimas semanas, o presidente Jair Bolsonaro tem insistido com a ideia de criar uma espécie de “vale-gás” para a população de baixa renda, mas a questão do financiamento está em aberto. Já o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), incluiu na pauta de hoje a criação do Programa Gás para os Brasileiros, de autoria do senador Eduardo Braga (MDB-AM), que institui subsídio para famílias de baixa renda na compra do botijão de gás.
Entre especialistas, é unânime a avaliação sobre o impacto que essa alta de preços provoca no orçamento das famílias. O analista do IBGE André Filipe Guedes Almeida afirma que, embora a fatia de 1,79% do gás de botijão possa parecer pequena, o item é o décimo com maior peso no INPC.
“O gás de botijão é um item importante no orçamento das famílias, especialmente naquelas com renda de até cinco salários mínimos, e tem 14 altas seguidas, desde junho de 2020. A alta ajudou a puxar a inflação no período”, explica.
Pelos dados da ANP, o preço médio no país do gás de botijão de 13 kg (o P13, de uso residencial) subiu de R$ 69,98 em agosto de 2020 para R$ 93,32 em agosto de 2021 (até dia 13). Na região Norte, ultrapassou a barreira dos R$ 100 no preço médio em julho e está em R$ 102,74 em agosto. A região está mais distante das refinarias, com exceção do Amazonas, que tem uma unidade, e é a que tem custo mais alto do produto no país.
E o aumento de do gás de botijão se soma à alta de outros itens com forte peso para famílias de mais baixa renda, como energia elétrica e alimentos. “Estamos falando de uma alta de 30% em 12 meses, então acaba sendo pesado para o orçamento das famílias de baixa renda. E isso vem junto com altas fortes em energia elétrica e alimentos, que respondem por parcela importante dos gastos”, diz a economista do Ipea Maria Andreia Parente Lameiras.
E esta conjunção de fatores de pressão de preços para as famílias de baixa renda ocorre em plena pandemia, que afetou de maneira mais intensa o mercado de trabalho para o grupo. “A inflação é ruim para todos, ricos ou pobres. Mas pesa mais para as famílias de mais baixa renda, que são as com grau de instrução mais baixo e também as que mais sofreram na pandemia, perdendo emprego e agora com mais dificuldade de inserção no mercado”, afirma.
Economista do Dieese, Patricia Souza também se mostra preocupada com a pressão da inflação neste momento de mercado de trabalho fragilizado. Além disso, ressalta que o impacto do gás no orçamento é ainda mais crítico em regiões do país com renda mais baixa, como no Norte e Nordeste.
“O preço do gás tem impacto em cidades como São Paulo, em que a renda média fica em torno de dois salários mínimos, mas afeta mais regiões como Norte e Nordeste, com pessoas com renda zero ou quase zero”, aponta, citando o avanço da insegurança alimentar e da fome entre as famílias e do uso de lenha para cozinhar, como alternativa ao gás de cozinha. “Houve aumento de gás, de energia, de alimentos. A conta não fecha. E como a pessoa faz para sobreviver? Cozinha com lenha, come menos e pula refeições”, afirma Patricia.
Na sua avaliação, o lançamento de um vale-gás pode até ser bom, mas seu impacto tende a ser restrito, deixando de fora parte de quem precisa. “Sabemos que este tipo de política dá mais renda, mas não atinge todo mundo. Seria melhor um subsídio para reduzir o preço”, diz a economista do Dieese, crítica à política da Petrobras de repasse das altas de preço do petróleo no mercado internacional.
O preço praticado pela estatal responde por 48,2% do preço final ao consumidor, enquanto a fatia da distribuição e revenda é de 37% e o ICMS é de 14,8%. Em março o governo federal zerou a cobrança de PIS/Cofins sobre o GLP residencial. Mas a medida foi insuficiente para conter a alta para o consumidor. A tributação do PIS/Cofins respondia por cerca de R$ 2.
Fonte: Valor Econômico
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