Considerado o energético da transição para uma economia de baixo carbono, o gás natural vê o crescimento de seu mercado atrasado por entraves logísticos, econômicos e regulatórios, dizem especialistas. No entanto, diversas empresas da cadeia – produtoras, transportadoras e distribuidoras – estão expandindo negócios e investindo em diversas regiões do país.
“A indústria do gás natural no Brasil enfrenta um desafio importante que é a sustentabilidade da demanda. Basicamente, ele concorre com outros combustíveis”, lembra o professor e pesquisador Edmar de Almeida, do Instituto de Energia da PUC-RJ. É preciso, diz ele, fazer com que o gás fique mais competitivo, por meio da redução de preço, assim como de impostos e tarifas de transporte e de distribuição.
A limitação logística e a necessidade de garantir segurança energética, dando flexibilidade às usinas térmicas, levam o Brasil a importar gás natural, especialmente o GNL (gás natural liquefeito). No ano passado, foram importados, na média, 22,06 milhões de metros cúbicos por dia, embora a produção nacional de gás tenha disponibilizado ao mercado 68,7 milhões de metros cúbicos diários. O aumento da oferta e a queda de preço do gás são importantes para que o grande potencial de consumo do energético presente na indústria siderúrgica, de mineração e de cimento possa ser aproveitado.
Um estudo divulgado em março pela CNI mostrou que, no Brasil, o gás custa dez vezes mais do que nos Estados Unidos e o dobro do que na Europa. A EPE colocou em consulta pública, prevista para ser encerrada no fim de outubro, o novo Plano Nacional Integrado das Infraestruturas de Gás Natural e Biometano (PNIIGB), visando promover uma estratégia para o desenvolvimento coordenado do setor. Há, no plano, 13 projetos prioritários, com foco na diversificação da oferta e garantia de fornecimento, além da integração do biometano à malha. A previsão é de R$ 42 bilhões em investimentos em diversas estruturas da cadeia do gás. Entre elas, estão novos gasodutos e expansão de alguns já existentes – como o trecho sul do Gasbol, que, devido a seu formato telescópico, vai se estreitando e cria um gargalo que afeta o abastecimento da região.
Uma das empresas que apostam firme no gás natural é a Petrobras. Foram reservados, em seu Plano de Negócios 2025-2029, US$ 11 bilhões para investimentos na ampliação da oferta do energético e energias de baixo carbono. Desses recursos, cerca de US$ 3 bilhões são da carteira de projetos em implantação e o restante, para empreendimentos sujeitos à avaliação.
A estatal prevê, por exemplo, dois novos gasodutos de transporte – um com capacidade para 16 milhões de metros cúbicos por dia e outro com 18 milhões de metros cúbicos diários. O primeiro faz parte do projeto Raia, na bacia de Campos, que tem entrada em operação prevista para 2028. Raia é um dos principais empreendimentos de gás natural do país, operado pela Equinor e tendo como sócios a estatal e a Repsol Sinopec. O outro gasoduto integra o projeto Sergipe Águas Profundas (Seap) e deve começar a operar depois de 2030. Em maio passado, com o início da operação do segundo módulo da Unidade de Processamento de Gás Natural (UPGN) do Complexo de Energias Boaventura (RJ), o projeto Rota 3 atingiu 100% de funcionamento. A capacidade total subiu para 21 milhões de metros cúbicos por dia. O gasoduto Rota 3, que leva gás do pré-sal à costa fluminense, foi inaugurado em setembro de 2024. A TAG, transportadora com gasodutos no Norte, Nordeste e Sudeste, prevê aportes de até R$ 5,4 bilhões para o período 2025-2029 e um dos seus projetos relevantes é o Ponto de Saída de Buriti (AM), em construção. A previsão é começar a operar em 2026, visando atender à demanda da Usina Termelétrica (UTE) Manaus I e aumentar a flexibilidade operacional da distribuidora local.
Há três projetos propostos pela TAG listados entre os prioritários da EPE, como um gasoduto para atender demanda do Sudeste, uma estação de compressão na Bahia e duplicações e estações de compressão para atender necessidades adicionais do Nordeste.
O gás transportado pela TAG é fornecido a dez distribuidoras, suprindo usinas termelétricas, refinarias, indústrias, entre outros. Desde janeiro passado, está em operação uma interconexão operacional, autorizada pela ANP, entre as malhas da TAG e da Nova Transportadora do Sudeste (NTS), que ampliou a integração entre as regiões Sul, Sudeste, Centro-Oeste e Nordeste e facilitou transações comerciais. Outra que aposta no crescimento do setor é a distribuidora Energisa, que atende cerca de 322 mil clientes de gás natural no Espírito Santo, com a ES Gás, e nos Estados de Alagoas, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Ceará, com a Norgás, que tem participação nas quatro distribuidoras de gás locais. A empresa vai investir R$ 1 bilhão nos próximos cinco anos na ampliação da rede no Espírito Santo e, só em 2025, mais de R$ 200 milhões no Nordeste.
“Hoje, a cobertura nacional do gás é de apenas 5%, com penetração ainda menor no Nordeste, onde chega a apenas 1,3%. Isso mostra o enorme potencial de expansão”, destaca Débora Oliver, diretora-presidente de negócios de gás da Energisa, que vê o setor diante de incertezas limitadoras da sua competitividade. Para ela, são necessários investimentos em infraestrutura, modernização regulatória e políticas de estímulo à demanda, alinhadas à agenda de descarbonização.
Em 2025, o consumo de gás natural até o início de outubro estava em cerca de 46 milhões de metros cúbicos diários, de acordo com a Abegás. Para 2026, a aposta é em aumento, com base na expectativa de bons indicadores para economia, principalmente da indústria. Esse setor, por sinal, é o que mais usa gás: de 25 milhões a 28 milhões de metros cúbicos diários até agora.
Em seguida, vem a demanda termelétrica, que pode oscilar de acordo com os períodos do ano. Tem sido, em média, de 11 milhões de metros cúbicos diários, mas em momentos de crise hídrica pode superar 20 milhões de metros cúbicos por dia. E, em terceiro, está o segmento automotivo, que, em média, consome cerca de 4,5 milhões metros cúbicos diários.
“A tendência é de alta nesses meses restantes de 2025, a depender do despacho para as termelétricas pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico, o que normalmente acontece no segundo semestre para mitigar efeitos do período seco sobre os reservatórios das hidrelétricas”, observa Marcelo Mendonça, presidente-executivo da Abegás. Ele aponta questões a serem resolvidas no setor. “É preciso acelerar medidas públicas que estimulem investimentos em infraestrutura, descarbonizando setores como o de transportes pesados, e incentivos tributários, entre uma série de medidas que aumentem a competitividade”, afirma o executivo.
Fonte: Valor Econômico / Revista de Infraestrutura e Logística
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