A FGV Energia, centro de estudos da Fundação Getúlio Vargas voltado a este mercado, avalia que o Brasil tem uma oportunidade de geração de emprego e renda por meio da exploração de recursos não-convencionais, como o shale gas. Após um trabalho de quase um ano de pesquisa, a entidade vai lançar no próximo dia 13, no Rio de Janeiro, o caderno “O Shale gas à espreita no Brasil: desmistificando a exploração dos recursos de baixa permeabilidade”. Segundo a pesquisadora da FGV Energia, Fernanda Delgado, uma das propostas é a realização de testes avaliar emissão de gases, contaminação de solo e variáveis ambientais. “Estes resultados seriam divulgados para que possam ser analisados pelos órgãos competentes ou por quem se interessar em estudar o assunto”, detalha. A especialista ainda afirma que o shale gas pode ser uma janela de novos negócios para as empresas de pequeno e médio portes. Por isso, em sua visão, o país deve trabalhar para atrair este tipo de companhia a investir na exploração deste potencial. “É preciso mostrar que existem recursos a serem explorados e toda uma indústria de shale que, se desmistificada, pode gerar bons retornos”, acrescentou Fernanda.
Como surgiu a ideia de produzir a publicação?
Nós acompanhamos todos os programas governamentais relacionados à energia aqui na FGV Energia, que é o centro de estudos do setor da Fundação Getúlio Vargas. Quando o Reate [Programa de Revitalização das Atividades de Exploração e Produção de Petróleo e Gás Natural em áreas terrestres] começou, nós começamos a acompanha-lo. Eu cheguei a publicar dois ou três artigos falando sobre o programa e o que a exploração onshore poderia trazer de bom para o Brasil, pensando principalmente no interior do país. Áreas essas que são mais carentes de infraestrutura, renda e emprego.
No ano passado, fizemos um seminário aqui na FGV Energia para discutir sobre esses reservatórios de baixa permeabilidade e também sobre a reativação de áreas onshore. Essa nova publicação é o reflexo de quase um ano de estudos em relação ao shale gás aqui no Brasil e o que isso pode ser interessante para o país, especialmente para as áreas de interior.
Qual o potencial do Brasil na exploração deste tipo de recurso?
Como tem acontecido em outros lugares do mundo, principalmente no modelo norte-americano, é um recurso que tem um potencial bastante significativo no Brasil. Mas, ao mesmo tempo, ele carece de uma série de destravamentos do setor e de investimentos em infraestrutura, como toda a operação onshore. Se você for incentivar o onshore, seja o convencional ou não-convencional, são necessárias infraestruturas de escoamento e também infraestruturas para levar as instalações para o interior e áreas remotas.
Mas o potencial de você ter uma capilaridade de distribuição de gás natural, além do que pode levar de operações para a criação de emprego e renda dentro do país, é muito interessante. E é um dos motivos pelos quais queremos colocar essa discussão. Estamos desde o ano passado trazendo este debate, junto ao Ministério de Minas e Energia e à Agência Nacional do Petróleo (ANP), para tentar entender o que precisa ser destravado, alterado e estudado para que o Brasil consiga testar a exploração deste tipo de recurso.
A exploração de shale gas ajudaria a economia brasileira a se tornar mais dinâmica?
O ponto mais importante é que a indústria onshore atrai empresas pequenas e médias. Aqui no Brasil, já temos a presença das majors. Já temos todas as grandes empresas operando no nosso offshore, em águas profundas e ultraprofundas. Mas o dinamismo, o dia a dia e a geração de vários pequenos empregos – que são tão importantes para o Brasil agora – vêm das pequenas e médias empresas. Elas vão contratar sísmica, instalações, estudos e equipamentos. Essas companhias precisam ser incentivadas a se instalarem no Brasil. O dinamismo da indústria se dá quando a pequena vira média, quando a média vira grande e, assim, sucessivamente.
Isto traz uma tônica interessante para nós, a mesma que vemos no modelo norte-americano, por exemplo. Guardadas as devidas proporções de financiamento, infraestrutura e investimentos. Mas a quantidade de pequenas empresas lá fora dá uma tônica muito interessante e isto deveria ser incentivado no Brasil. Acho que este é o ponto mais importante: dar uma visão de que o país é um celeiro importante para pequenas e médias empresas. Além disso, é preciso mostrar que existem recursos a serem explorados e toda uma indústria de shale que, se desmistificada, pode gerar bons retornos. Tanto em termos de geração de emprego e renda, como maior abastecimento de gás natural acessível e barato. Afinal, energia boa é energia barata. Com essa capilaridade maior, com o gás chegando a determinadas regiões, isto parece ser muito interessante. É nisto que apostamos.
E em termos de tecnologia? Existem desafios?
As tecnologias estão postas. De uma forma geral, dentro do setor petrolífero no Brasil, trabalhamos com o estado da arte das tecnologias. A questão do fraturamento hidráulico, que é uma das formas de explorar os reservatórios de baixa permeabilidade, é amplamente conhecida. Não tem nenhum segredo tecnológico. A não ser que o desejo seja fraturar em profundidades muito grandes, o que não é o caso das formações brasileiras. Isto seria mais para as formações chinesas, por exemplo. Mas a tecnologia está posta. É uma questão de trazer ao Brasil estas tecnologias ou desenvolver a própria indústria local para o fornecimento destes equipamentos, que são parecidos mas não iguais aos da exploração convencional.
A exploração de recursos não-convencionais enfrenta resistência de ambientalistas. Como lidar com isso?
Existe uma série de matizes ambientais que devem ser observadas. Mas cabe ressaltar que toda a exploração de hidrocarbonetos terá uma questão ambiental. Seja onshore ou offshore. A forma de se entender é uma das propostas que fazemos no caderno, que é um poço transparente, um poço teste. Seriam realizados testes, como estão sendo feitos na Colômbia e em algumas áreas dos Estados Unidos também. Os testes seriam monitorados e abertos para acompanhamento do Ministério de Minas e Energia, dó órgão ambiental e da própria sociedade. Neles, um monitoramento de 24 horas durante a perfuração do poço demonstraria tudo o que está sendo emitido de gases, contaminação de solo e variáveis ambientais. Estes resultados seriam divulgados para que possam ser analisados pelos órgãos competentes ou por quem se interessar em estudar o assunto. A ideia que a FGV Energia traz é que se autorize a execução deste projeto de poço transparente, que seria uma espécie de poço escola.
Como está a questão da regulação hoje no Brasil?
Do ponto de vista da ANP, é um recurso como outro qualquer e está contemplado. Ele tem alguns entraves legislativos, que foram algumas jurisprudências e que proibiram a exploração do shale, principalmente no Paraná. Isto está sendo mencionando no caderno também. A nossa ideia é que se comece [a exploração destes recursos] pelo Recôncavo Baiano. Ali, não há grandes entraves em relação a isso.
A regulação está posta. Não é preciso muito ajuste. Seria só mesmo entender o porquê dessas proibições colocadas em alguns estados e tentar derrubá-las de alguma forma, usando argumentos científicos e embasados.
Qual será a principal contribuição deste caderno para o setor?
O caderno é muito interessante porque traz a discussão sobre o tema. Trazer o debate de uma maneira pública, com embasamento científico, é uma grande contribuição para a sociedade. O que a FGV faz é a ponte entre a indústria e a academia, dando voz à sociedade no que entendemos ser benéfico para ela. Se existe no Brasil uma oportunidade de entrada de novos players, de empresas médias e pequenas, com geração de emprego para o interior, isso deve ser discutido de forma clara. Salvaguardando todos os tabus que ouvimos falar no meio internacional e fazendo nossos próprios testes. Avaliando se aquilo é bom para o país ou não.
Fonte: PetroNotícias
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