A YPFB procurou a Petrobras para renegociar os preços do gás natural fornecido pela empresa boliviana, em meio a um cenário de alta da cotação do insumo no mercado internacional, mas não obteve resposta formal da estatal brasileira até o momento, apurou o Valor.
A negociação de gás natural entre a YPFB e a Argentina que reduziu a entrega para a Petrobras em 30% (6 milhões de milhões de m3 /dia) teve motivação apenas comercial.
A Argentina tem alto consumo de gás no inverno, para calefação. Diante deste cenário, a YPFB viu uma oportunidade de negociar com o país, mesmo tendo que arcar com o custo de uma cláusula chamada “delivery or pay”.
Isso porque o contrato com a Petrobras prevê o fornecimento de 20 milhões de m3 /dia, com entrega mínima de 14 milhões de m3 /dia – uma cláusula prevê o pagamento do valor do gás em caso de entrega abaixo do valor contratado. O valor pago pela Petrobras, hoje, é de US$ 7 por um milhão de BTU (British thermal unit).
Seguindo o contrato, a empresa manteve o fornecimento mínimo e negociou os 6 milhões de milhões de m3 /dia por US$ 19/MMBTU (milhão de BTU).
Como a YPFB pagaria os mesmos US$ 7/MMBTU para a Petrobras, a empresa ainda teria um ganho de US$ 12/MMBTU.
Segundo uma fonte a par do tema e que falou sob a condição de anonimato, a YPFB considera incompreensível que a Petrobras não queira renegociar preços do gás, como já ocorreu no passado ao mesmo tempo que a companhia brasileira tem adquirido gás natural liquefeito (GNL) a valores entre US$ 23 e US$ 25/MMBTU.
“A YPFB não quer causar dano ao Brasil”, disse, ressaltando que o mercado brasileiro é importante para a Bolívia. Petrobras e YPFB são sócias na Transportadora Brasileira Gasoduto Bolívia-Brasil (TBG) e na GTB (Gas TransBoliviano, administradora do gasoduto transnacional pelo lado boliviano), além das atividades de exploração e produção naquele país.
“Queremos ser um parceiro de longo prazo do Brasil, mas não se pode fazer [parcerias] às custas de não valorizarmos nossas reservas”, acrescentou a fonte.
Procurada pelo Valor, a Petrobras reafirmou que, desde o início de maio, a YPFB reduziu de forma unilateral em 6 milhões de m3 /dia as entregas de gás natural. “A Petrobras vem exercendo seu papel diligentemente, reivindicando o cumprimento do contrato com a YPFB e adotando as medidas para assegurar o fornecimento aos seus clientes”, disse.
A companhia salientou que situações pontuais de falhas com fornecedores não afetam os contratos vigentes entre ela e seus clientes. “Tais contratos possuem preço previamente estabelecido, cuja atualização é baseada em fórmulas paramétricas atreladas a indicadores de mercado e acordadas entre as partes.”
A redução no fornecimento de gás não traz riscos para o sistema, de acordo com Celso Dall’Orto, sócio e gerente de projetos da PSR Consultoria. Segundo ele, o momento atual é de tranquilidade no setor elétrico, com reservatórios cheios em três dos quatro submercados do país (Norte, Nordeste e Sul) e com níveis de armazenamento considerados satisfatórios no Sudeste/Centro-Oeste. Esse quadro tira a necessidade de elevados despachos das termelétricas no momento, o que ameniza qualquer pressão pelo fornecimento de gás.
Ele lembra ainda que no ano passado entrou em operação comercial uma grande quantidade de usinas eólicas e solares bem como linhas de transmissão, o que minimiza a necessidade de elevado uso das térmicas.
Excluindo a geração termelétrica, grande consumidora de gás e que depende de ordens de geração pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), o consumo de gás natural tende a ser estável em todos os demais segmentos, como residências, indústrias e uso veicular, e em volumes mais baixos.
Assim, avalia Dall’Orto, a maior questão envolvendo as duas empresas é mais comercial do que operacional.
O redirecionamento de parte do gás da Petrobras para a Argentina também foi alvo de insinuações, sem provas, do presidente Jair Bolsonaro de que a Bolívia teria cortado o fornecimento de gás natural que envia para o Brasil para favorecer o expresidente Luiz Inácio Lula da Silva, seu principal adversário na corrida presidencial.
O presidente da Bolívia, Luis Arce, foi ministro da Economia de Evo Morales, e Lula é um tradicional aliado boliviano. A Argentina é presidida há um ano por Alberto Fernández, também um governo de esquerda – o que teria motivado as afirmações do presidente brasileiro, de ultradireita.
“A Bolívia cortou 30% do nosso gás para entregar à Argentina. Como agiu a Petrobras nesta questão também? Parece que é tudo orquestrado. Um gás que, se tiver que comprar de outro local, é cinco vezes mais caro”, disse Bolsonaro, na semana passada.
Fonte: Valor Econômico
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