A Petrobras voltou a perder participação de mercado na comercialização de gás natural em 2024, com reflexos sobre a rentabilidade de seu negócio.
A chegada de novos concorrentes (Edge, Eneva e MGás são exemplos) levou a um novo movimento de desconcentração, ainda que não o suficiente para mudar estruturalmente o setor e ameaçar a posição de agente dominante da estatal – que, aliás, partiu para o contra-ataque.
Levantamento da agência eixos, com base em dados (preliminares) da ANP mostra que o market share da Petrobras caiu para menos de 70% do gás firme contratado pelas distribuidoras no Brasil.
A participação do gás privado no mercado cativo (que encolheu) está em 33%. Há um ano, ela era de 29%.
A realidade é diferente em cada região. Por exemplo: no Nordeste, onde o mercado vive, de fato, uma desconcentração, a fatia do gás privado é de 71% (relativamente estável); e no Sudeste, a desconcentração avançou de 20% para cerca de 25%.
No mercado livre, faltam dados públicos sobre o volume comercializado, mas fato é que por lá a Petrobras, embora dê sinais de reação, tem um market share menor.
Petrobras sente o golpe
Os efeitos do aumento da concorrência sobre a Petrobras estão visíveis nos resultados da companhia de 2024.
As vendas de gás natural da estatal recuaram 4% (ou 2 milhões de m3/dia) no ano passado, para 47 milhões de m3/dia – retomando, assim, patamares da década de 2000.
Os indicadores financeiros da área de Gás e Energias de Baixo Carbono da petroleira seguiram o movimento: as receitas caíram 7,4% (para R$ 51,4 bilhões); o lucro bruto recuou 10,7% (R$ 24,159 bilhões); o indicador de geração de caixa (Ebitda ajustado) despencou 39,1% (R$ 8,2 bilhões);a margem Ebitda (lucratividade operacional) caiu de 24% para 16%; e o ROCE (Retorno sobre o Capital Empregado), que ajuda a medir o nível de eficiência no capital investido, baixou de 10,7% para 4,2%.
Ao comentar os resultados, a estatal citou que a piora no desempenho reflete “menores volumes e preços de venda de gás, decorrentes da abertura do mercado de gás natural, da redução de market share e dos movimentos para preservação da competitividade da Petrobras, tais como o prêmio por performance”, lançado em meados do ano passado.
Petrobras promete reação
No fim de 2024, a Petrobras anunciou mais uma resposta à concorrência. O prêmio de incentivo à demanda oferecerá, a partir deste ano, descontos no preço do gás para volumes acima do compromisso mínimo (take-or-pay).
Promete, assim, recuperar as vendas, num momento em que a estatal se prepara para ofertar mais gás.
A companhia espera iniciar, no primeiro trimestre, as operações do segundo módulo da unidade de processamento do Complexo Boaventura, em Itaboraí (RJ), com capacidade para 10,5 milhões de m3/dia.
O primeiro trem da UPGN, de igual capacidade, começou a processar gás em novembro. O prêmio de incentivo à demanda introduzido pela Petrobras em sua política de preços em 2024 aumenta a competitividade da estatal frente ao gás importado – em especial ao gás natural liquefeito (GNL) e ao gás argentino spot, na avaliação da Rystad Energy.
O reposicionamento comercial da petroleira não só estimula a retirada de volumes adicionais, como também protege a estatal da concorrência, já que oferece um desconto maior para o gás que ultrapassa o limite do take-or-pay – o volume mais sensível às arbitragens.
A Rystad estima que o desconto oferecido pela Petrobras deve representar uma economia de US$ 132 milhões para as distribuidoras estaduais em 2025, no custo de aquisição de molécula.
Dentre as concessionárias que já aderiram ao prêmio de incentivo da Petrobras estão a CEG (RJ), CEG Rio (RJ), CEGÁS (CE) e Copergás (PE).
Gas release de volta à mesa?
O tema da concentração de mercado, aliás, pode voltar ao debate este ano no Congresso. Na esfera regulatória, não andou: a ANP chegou a incluir, em 2023, o gas release na agenda – mas a Análise de Impacto Regulatório não avançou.
O senador Laércio Oliveira (PP/SE) anunciou recentemente, durante o aquecimento gas week 2025, que pretende apresentar um projeto para criar um programa de gas release, o Progás, depois da tentativa frustrada de emplacar uma política de desconcentração no relatório do Programa de Aceleração da Transição Energética (Paten), em 2024.
Oliveira tem mantido contato com os agentes do mercado, para colher contribuições ao projeto. O parlamentar também conta com o apoio do Ministério de Minas e Energia.
O primeiro parecer apresentado por Oliveira na Comissão de Infraestrutura do Senado em 2024 propôs a redução compulsória da participação de mercado de qualquer agente que detenha mais de 50% da oferta de gás — o que direciona a política para a Petrobras.
A proposta original, contudo, enfrentou resistências e, após alinhamento com o MME e negociações com a própria estatal, o senador alterou o texto para acomodar interesses de diferentes agentes (consumidores, produtores e Petrobras): preservou o gás produzido pela companhia e GNL importado da proposta de criação de uma política de desconcentração do mercado.
O foco passou, então, a ser impedir a estatal de comprar gás de outros produtores nacionais, além de impor limites à Petrobras na importação da Bolívia – e, futuramente, da Argentina.
Fonte: Eixos
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