A Câmara dos Deputados e o Senado aprovaram, nessa quinta (30), a Medida Provisória 1304/25, que reformula as regras do setor elétrico. Editada para conter o aumento nas tarifas de energia devido a subsídios e à contratação obrigatória de usinas termelétricas, a MP 1.304/2025 passou a tratar de vários outros pontos, entre eles a abertura do mercado livre de energia para todos os consumidores. O texto, aprovado na forma de um projeto de lei de conversão (PLC 10/2025) segue para a sanção presidencial. A medida foi aprovada pela comissão mista e logo depois pelo Plenário da Câmara dos Deputados com duas mudanças. O prazo para a aprovação iria até 7 de novembro, mas a decisão foi de pautar a votação no Senado em seguida. O texto foi aprovado pelos senadores em votação simbólica, sem mudanças com relação à versão da Câmara. “A discussão foi longa na comissão, foram discutidos todos os aspectos. Fizemos aquilo que foi possível no regime de democracia e num regime de correlação de forças: modernização, reestruturação no setor, com compromisso de levar uma energia mais barata para o consumidor, reduzir a conta da CDE [Conta de Desenvolvimento Energético], fazer o reequilíbrio do sistema e enfrentar as discussões estratégicas do setor”, disse o senador Eduardo Braga (MDB-MA), relator do projeto.
Uma das principais alterações feitas no Congresso com relação ao texto original foi a inclusão da abertura do mercado livre de energia para consumidores residenciais e comerciais. A implantação seguirá um cronograma definido pelo projeto: após dois anos da entrada em vigor da lei no caso de indústria e comércio e em três anos para os consumidores residenciais. Na Câmara, a votação em plenário se deu na sequência da aprovação, pela comissão mista, do relatório do senador Eduardo Braga (MDB-AM), relator do projeto. A comissão chegou a um acordo para a votação após dois dias de debates. Na votação no Plenário da Câmara, foi aprovada a retirada de dispositivo que determinava a cobrança de R$ 20 a cada 100 kWh injetados pelos novos entrantes da geração distribuída. Antes disso, durante a votação do relatório pela comissão mista, o dispositivo já havia provocado protestos. O deputado Lafayette de Andrada (Republicanos-MG) disse que a MP iria inviabilizar a geração distribuída. “Enfiaram uma cobrança de R$ 20 por kWh para quem quer gerar sua própria energia. Querem cobrar de quem está gerando sua própria energia”, disse. Ele reconheceu que o texto vale apenas para novos produtores de energia. “Está matando a geração distribuída daqui para a frente. A partir de amanhã, não tem mais geração distribuída”. Por meio de votação simbólica, foi rejeitada, no Plenário, a retirada de dispositivo que trata da nova metodologia de cálculo do Preço de Referência do Petróleo, que busca aumentar a arrecadação da União no setor. Também foi aprovada emenda aglutinativa determinando ressarcimento de cortes na geração de projetos eólicos e solares, com exceção dos causados por sobreoferta de energia e estabelecendo como fonte para a compensação os Encargos de Serviço do Sistema (ESS).
O texto da MP 1.304 aprovado pelo Congresso Nacional inclui dispositivo que estabelece a abertura completa do mercado de energia elétrica para todos os consumidores brasileiros em até 36 meses. O presidente da comissão que analisou a MP, deputado Fernando Coelho Filho (União-PE), disse que o texto deixou prazos suficientes para que o setor de distribuição se prepare para as mudanças, assim como a CCEE e a Aneel,”para fazer a abertura do mercado de forma responsável e dar ao consumidor brasileiro em até 24 meses a oportunidade de escolher de quem ele quer comprar energia elétrica”. Rodrigo Ferreira, presidente-executivo da Abraceel, considera que a inclusão do dispositivo representa “um momento histórico para o consumidor e para a economia, pois o mercado livre de energia vai se refletir em contas de eletricidade mais baratas e diversidade de produtos, que resultam em mais eficiência, tanto no setor elétrico como em toda a economia”. Ferreira destacou outras medidas importantes para o setor de energia elétrica, como os comandos para a regulamentação do Supridor de Última Instância (SUI), que responderá pelo atendimento aos consumidores livres em casos de problemas dos fornecedores de origem, e o teto para o crescimento da Conta de Desenvolvimento Energético. “Agora, os valores que superarem o teto em cada rubrica da CDE passam a ser rateados entre os próprios beneficiários, diferentemente do que ocorre atualmente, com os custos rateados por todos os consumidores”, afirmou.”A abertura do mercado livre e a criação do supridor de última instância (SUI) são importantes avanços setoriais. O setor já está maduro o suficiente para alcançar todos os consumidores. Haverá um processo de conscientização e aprendizado da população em geral, mas não podemos deixar essa etapa (natural de setores regulados) frear o progresso”, disse Felipe Zaratini, head da área de energia do Felsberg Advogados. Ele ressalvou, porém, que “infelizmente, a medida não trouxe muitos avanços no tema do armazenamento de energia. A positivação legal da atividade e a possibilidade de inclusão no REIDI são importantes, mas não englobam todo o tratamento que esse relevante setor merece”.
Depois de alguns dias de uma guerra de comunicados com outras entidades do setor elétrico na qual defendeu a manutenção das condições estabelecidas para a geração distribuída (GD) pelo marco regulatório do setor, a Associação Brasileira de Geração Distribuída (ABGD) manifestou satisfação com o texto da MP aprovado no Congresso. “A aprovação da Medida Provisória 1.304 no Congresso Nacional representa um marco para a segurança jurídica e para o reconhecimento definitivo da GD como pilar da transição energética e da democratização do acesso à energia limpa”, afirmou a entidade em comunicado. A entidade considerou que o texto aprovado “preserva integralmente os direitos dos consumidores e investidores, reafirmando que a GD é parte da solução – não um ônus para o sistema elétrico – e que o Brasil segue no caminho da modernização, da eficiência e da sustentabilidade”.
Uma das mudanças feitas na Câmara foi a aprovação de uma emenda que assegura o ressarcimento pelo curtailment de energia eólica e solar. Para Braga, a mudança aprovada na Câmara onera o sistema. De acordo com Zaratini, a aprovação da MP é um pontapé inicial para a resolução do problema do curtailment na geração centralizada, prevendo o ressarcimento para os cortes por questões do sistema de transmissão (indisponibilidade e confiabilidade) e mecanismos de compartilhamento de riscos. “Embora os cortes por razão energética (sobreoferta de energia) tenham ficado de fora da compensação, isso reduz as chances dela ser questionada por agentes do segmento de consumo”, disse Zaratini. Ele destacou também a criação de mecanismo competitivo para incentivar a geração de energia e a resposta de consumo nos horários de maior demanda, o que contribuiu para a solução do curtailment energético.
A Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee) avaliou como positiva a retirada, pelo relator, do dispositivo que tratava dos benefícios fiscais das áreas da Sudam e Sudene, “medida que preserva uma política pública importante para o desenvolvimento regional e para a manutenção de investimentos em infraestrutura nas regiões Norte e Nordeste”. Conforme manifestou a entidade por meio de comunicado, “houve também avanço com a redução do limite máximo proposto das multas, de 4% para 3% do faturamento anual”. Ainda assim, a Abradee considera que o patamar atualmente em vigor, de 2%, já representa um nível elevado de penalização. A entidade destacou, contudo, “que pontos essenciais para a modernização do setor seguem pendentes de inclusão no texto final, como novas modalidades tarifárias (pré-pagamento, tarifas por horário e tarifas multipartes) e a separação contábil entre distribuição e comercialização, medida que amplia a transparência e o equilíbrio econômico-financeiro das concessionárias”.
O deputado Danilo Forte criticou a criação de cotas para a produção de energia eólica por estado. “Não posso obrigar um Estado a ter vento. Essa questão fica muito em função da viabilidade ou não do insumo”, disse. Segundo ele, constituir um limite por estado vai criar um empecilho ao estímulo à produção de energia eólica. Para Forte, o texto está retrocedendo na viabilidade da geração de energia limpa, ampliando participação das térmicas a carvão. “Estamos matando os investimentos de eólica e solar no Nordeste e priorizando térmicas, inclusive a carvão, para salvar o passado de uma indústria de mais de 100 anos e que não conseguiu evoluir para uma indústria sem emissão de carbono”, declarou.
Por fim, um dos pontos de destaque do texto aprovado é o Capítulo II, que estabelece regras favoráveis às usinas termelétricas movidas a carvão mineral nacional. A medida: determina a contratação de reserva de capacidade para termelétricas a carvão até 31 de dezembro de 2040 e prorroga por 25 anos as outorgas de concessão e autorização para produção independente de energia elétrica desses empreendimentos. A regra se aplica a usinas que consomem o montante mínimo de carvão nacional estipulado em contratos vigentes em 31 de dezembro de 2022, e aquelas com Contrato de Comercialização de Energia no Ambiente Regulado (CCEAR), que expiram até 31 de dezembro de 2028. Permite, também, que usinas a carvão (nacional ou importado) antecipem seu descomissionamento, sem ônus, mediante solicitação à Aneel com seis meses de antecedência, sendo a agência responsável por viabilizar o distrato dos contratos regulados. Em defesa do texto, o relator Eduardo Braga argumentou que a inclusão das regras visava a proteção social e econômica. Ele citou o caso da cidade de Candiota (RS), onde estariam em risco 7 mil empregos, destacando que o texto não é de sua autoria original, mas sim baseado em uma emenda (nº 0037) do Senador Esperidião Amin. O senador Luis Carlos Heinze (PP-RS) também manifestou apoio ao relator, ressaltando a importância da medida para equalizar o prazo de funcionamento das usinas gaúchas com o de Santa Catarina, que já tem previsão até 2040. Durante as negociações na comissão mista, Braga propôs uma manobra para contornar um possível obstáculo: ele separou a questão das termelétricas a gás, que está sujeita a um veto presidencial em análise no Congresso, garantindo que o tema não prejudicasse a votação da MP.
Fonte: EnergiaHoje
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