A pretensão do MME, de destravar o leilão de gás natural da União via MP 304/2025 (a da reforma do setor elétrico), sofreu um revés no Congresso Nacional nos últimos dias. O relator, o senador Eduardo Braga (MDB/AM), abandonou pelo caminho o dispositivo original da MP que atribuía ao CNPE o poder de determinar as condições e o valor de acesso do gás da União às infraestruturas de escoamento (SIE) e processamento (SIP). A proposta, que conta com a oposição da Petrobras e seus sócios no SIE/SIP, era a principal aposta do governo para baratear o acesso da Pré-Sal Petróleo S.A. (PPSA) ao midstream, após tentativas frustradas de negociação com a Petrobras; e conseguir, assim, oferecer um gás mais competitivo à indústria. Do texto original do Executivo, ficou, ao fim, o trecho que autoriza a contratação da Petrobras pela PPSA, como comercializadora do gás da União – justamente a contrapartida oferecida pelo governo para fazer avançar a regulação das tarifas do SIE/SIP. A terceirização da comercialização do gás da União para a Petrobras desagrada não só consumidores industriais (os potenciais compradores), que veem na proposta a criação de um intermediário que onerar o gás da União; como os próprios comercializadores concorrentes da Petrobras, que veem a estatal sair fortalecida em sua posição dominante. Após sinalizar para a destinação do gás da União para matéria-prima, mirando os fertilizantes — algo que o MME também discute internamente – Braga também ignorou, ao fim, a disputa travada via emendas sobre que fim dar ao gás da União. Mas a MP da reforma do setor elétrico não deixou o setor de gás completamente de fora: Passou a emenda para viabilizar novos gasodutos: o superávit do Fundo Social poderá prover linhas de financiamento reembolsável para investimentos em infraestruturas estratégicas no setor de gás natural, a serem definidas pelo CNPE; e, sob críticas das petroleiras, foi aprovado o dispositivo que atribui ao CNPE o poder de definir limites de reinjeção de gás nos projetos de produção em áreas que ainda serão leiloadas. E depois de idas e vindas, o pacote de contratação das termelétricas a gás locacionais (herança da lei de privatização da Petrobras, no governo Bolsonaro) ficou de fora, para ser tratado na discussão dos vetos do PL das eólicas offshore.
PPSA mira leilão de curto prazo e outro estruturante
A formatação do leilão de gás da União tem sido trabalhada internamente, no MME, para 2026 – o último ano do atual mandato de Lula. Derrotado no Legislativo, o governo perde a tentativa de regular via CNPE as tarifas do SIE/SIP e terá de seguir a via negocial com a Petrobras. O texto da MP 1304 ainda passará por sanção presidencial. Sem baratear as condições de acesso às infraestruturas, a ambição de oferecer um gás barato à indústria enfraquece. Dentro da PPSA, o leilão do gás está em segundo plano neste momento. Em entrevista exclusiva ao estúdio eixos na OTC Brasil 2025, o presidente da estatal, Luis Fernando Paroli, disse que o foco atual é entregar o leilão das áreas não contratadas na partilha do pré-sal – parte do pacote de socorro fiscal. “Olha, na verdade, a PPSA é uma empresa muito pequena, temos setenta e poucas pessoas… a gente teve que focar bastante as nossas energias nessa questão do leilão de áreas não contratadas. O pessoal de comercialização está lá focado no gás e está trabalhando nisso, mas tivemos que priorizar as nossas energias”, disse Paroli, sem precisar uma data para o leilão do gás. O presidente da PPSA conta que a estatal trabalha na formatação de duas vendas para o gás da União: uma de curto prazo, com contratos de um a três anos; e uma de mais longo prazo, estruturante, com contratos de quatro a 15 anos. A divisão tem a ver com o perfil da oferta: o volume de gás da União começa pequeno e só tende a dar um salto e se estabilizar ao fim da década. “Para que a gente possa fazer um leilão em que a gente possa garantir uma quantidade maior de gás, possa realmente influenciar diretamente no mercado, seja para uma indústria específica ou não – que isso não vai ser determinado pela gente, vai ser determinado pelo governo, pelo CNPE – é importante que a gente tenha uma estabilidade na produção”.
Liquidez
A ideia de oferecer um leilão de curto prazo, segundo Paroli, é dar mais liquidez ao mercado: “É olhar o mercado spot, inicialmente, para tentar pegar ali comercializadores e pequenos produtores. E depois, a gente fazer um leilão mais estruturado e mais longo prazo”. O diretor sênior da Alvarez & Marsal, Rivaldo Moreira Neto, acredita que o gás da União não será capaz, por si só, de revolucionar o mercado e que, por isso, o leilão da PPSA deve ser desenhado como uma oferta mais ampla, que reunisse outros vendedores – inclusive produtores argentinos.
Produtores celebram revés da regulação do SIE/SIP
O IBP viu com bons olhos a derrubada do dispositivo que atribui ao CNPE a definição das condições de acesso das infraestruturas de escoamento e processamento para o gás da União. Em entrevista ao estúdio eixos durante a OTC Brasil 2025, a diretora de Gás Natural do IBP, Sylvie D’Apote, destacou que a medida se trata de uma “inovação deletéria” em relação à Lei do Gás de 2021. A discussão sobre as condições de acesso ao SIE/SIP, porém, ainda não está superada, na visão dela. Sylvie defende, no entanto, que o lugar correto para o debate deveria ser a ANP. “Acho que essa discussão vai ressurgir, em particular porque esse gás que o governo quer oferecer à indústria, ou talvez a uma parte da indústria, precisa ser leiloado, mas afinal ele vai ter que negociar seu acesso ao escoamento e processamento”. Para Sylvie, definir valores diferenciados de acesso para o gás da União fere a isonomia do acesso, o que pode levar à judicialização. No saldo final da MP 1304, porém, o IBP manifestou preocupação com as novidades do texto, como as novas regras de cálculo do preço de referência do petróleo e o novo dispositivo para controle da reinjeção de gás. Embora, nesse último ponto, o texto preserve projetos já aprovados do risco de revisão dos índices de rejeição, Sylvie defende que a decisão sobre o assunto cabe ao produtor. “No pré-sal a gente tem situações de todos os tipos. Tem situações em que tem muito CO², situação em que, na verdade, é preciso estimular com rejeição. Então, é muito importante deixar essa decisão ao operador na definição da sua estratégia”, disse.
Fonte: Eixos
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