Potencial de produção está avaliado em 82 bilhões de m³/ano, volume que poderia contribuir para suprir demanda de energia do país
O mercado de biogás no Brasil teve algumas iniciativas involuntárias ao longo de sua história. Na década de 80, foi palco de um programa chamado Prometano, focado em agricultura e saneamento rural. Nos anos 2000, o foco continuou no saneamento rural, com o acréscimo da transação dos créditos de carbono. Apenas na última década, porém, a fonte renovável, armazenável e com vocação para entrar na base do sistema passou a ser vista como solução energética, com projetos de grande porte, regulações e participação em leilões.
Embora hoje a produção ainda esteja aquém do imenso potencial, avaliado em 82 bilhões de m³/ano, as expectativas para a fonte são das melhores, muito por conta do grande incentivo representado pela Política Nacional de Biocombustíveis (Renovabio), já aprovada e que começa a valer no fim de 2019. Para entender melhor o setor, a Brasil Energia conversou com o presidente da Associação Brasileira de Biogás e Biometano (Abiogás), Alessandro Gardemann. A seguir, os principais trechos da entrevista:
O que esperar do mercado de biogás e biometano no contexto do novo governo federal que assume em 2019?
O importante é não ter retrocesso. A questão regulatória já está resolvida para permitir o uso da fonte na base elétrica e como combustível substituto do diesel e o Renovabio já foi aprovado, aguardando apenas regulação da ANP. Basta apoiar essas conquistas e, claro, manter o Brasil no Acordo de Paris. O país é a maior economia de baixo carbono do mundo e essa é uma vantagem competitiva nossa, ao contrário, por exemplo, dos Estados Unidos. Temos que ter todo o interesse, não só ambiental, mas econômico de apoiar o acordo global.
No âmbito das renováveis, o biogás tende a ser mais competitivo?
Sim, o biogás é uma energia renovável de base, armazenável, com várias externalidades ambientais, ao contrário das intermitentes eólica e solar. A fonte, inclusive, pode ser complementar a esses parques renováveis. Outro ponto é que, diferentemente das eólicas e solares, o biogás está sempre na porta da carga e gera muito mais emprego por MWh.
O senhor acha que essas vantagens não são percebidas no planejamento energético?
Em parte sim, mas o caminho do biogás é inexorável. Temos tecnologia, know-how e potencial. Ele veio para ficar e vai crescer por si só pelas suas características energéticas. Só é preciso mais avanços nas regulações estaduais, principalmente para garantir que a produção e comercialização do biometano seja livre e não um monopólio das distribuidoras de gás, já que o combustível é um gás natural equivalente. Mas isso já começa a ocorrer com as regulamentações dos estados de São Paulo e Paraná, por exemplo. Já na questão ambiental, o Renovabio será um divisor de águas para o setor.
Especificamente para o biogás, como será essa influência positiva do Renovabio?
O biometano tem uma pegada de carbono muito grande, reduz em 96% as emissões de CO2, índice só igual ao etanol celulósico. Enquanto isso, o etanol reduz entre 70% e 80%. Outro aspecto importante é que o biometano também pode ajudar produtores de etanol e de biodiesel a ficarem com pegadas de carbono melhores. Se eles deixam de usar o diesel na produção, seja em logística ou em máquinas e equipamentos da produção, substituindo pelo biometano, a análise de ciclo de vida deles será mais positiva, gerando notas mais altas pelas firmas inspetoras, que atestam a contribuição individual de cada unidade produtora para mitigar uma quantidade de gases do efeito estufa em relação ao substituto fóssil, para posterior certificação pela ANP. Estas notas, por sua vez, vão gerar os CBios (Créditos de Descarbonização por Biocombustíveis), emitidos pelos produtores e importadores de biocombustíveis.
Os CBios, então, serão o grande incentivo para o programa rodar?
Sim, porque eles serão um ativo financeiro negociado em bolsa. E a especulação positiva do mercado vai torná-los atrativos não só para os distribuidores de combustíveis, que, pelo Renovabio, precisarão adquiri-los para cumprir suas metas de descarbonização, como para outros agentes, que poderão comprar e vender CBios na bolsa de valores, trazendo liquidez para o mercado. Isso é uma grande inovação global. E seguindo o cronograma do programa, que, em breve, já terá regulamentação pronta pela ANP, no começo de 2020, esse sistema estará valendo.
Quanto esse cenário deve impulsionar no volume de produção de biogás?
Hoje, a produção é de cerca de 500 mil m³ por dia, mas imaginamos que, em 2026, o volume seja de 10 milhões de m³ por dia.
Qual o potencial total de produção do país?
É, possivelmente, o maior do mundo. Atualizamos um estudo de 2015, concluído no mês passado, e aumentamos o potencial, que era de 70 bilhões de m³ por ano para 82 bilhões de m³/ano. Isso porque, no levantamento anterior, não tínhamos incluído biomassas importantes que podem sofrer biodigestão para gerar o biogás, principalmente as palhas de milho e de soja. No contexto geral, o setor sucroenergético tem o maior potencial, principalmente em razão da vinhaça, mas também por causa dos outros resíduos, com 41 bilhões de m³/ano. Em seguida, a agroindústria contribui com 38 bilhões de m³/ano e o saneamento ambiental, representado pelo biogás captado de aterros ou por meio da digestão orgânica dos resíduos e pelo lodo de estação de tratamento de esgotos, com 4 bilhões de m³/ano. Para se ter uma ideia, se esse volume de biogás for empregado em geração elétrica, pode suprir 36% da demanda do Brasil. Já se for purificado para se tornar o combustível biometano, o que seria um potencial de 45 bilhões de m³/ano, substituiria 70% do diesel atualmente consumido no país.
Fonte: Brasil Energia Online
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