Uma briga que envolve vários atores empresariais e políticos e já dura anos, com reviravoltas de alinhamentos nos últimos meses, pode chegar ao fim nesta semana com a votação, pela Câmara, do projeto de lei 6407/13, que estabelece a Nova Lei do Gás, atualizando a legislação atualmente em vigor, de 2009 (e vários decretos anteriores e posteriores, o que faz da regulação do setor um emaranhado de tubos subterrâneos, tal qual um gasoduto).
A proposta defendida pelo governo, e que tem o apoio do relator, Laércio Oliveira (PP-SE), mexe em alguns pontos sensíveis para o setor de transporte e distribuição de gás natural, que tenta emplacar mudanças de última hora no texto.
A novidade é que, nas últimas semanas, o projeto tal qual imaginado por Paulo Guedes e o resto do governo ganhou o aval do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), antes sensível aos argumentos dos distribuidores de que era preciso investir em infraestrutura para ampliar o uso do gás natural no Brasil.
Atualmente, a Petrobras tem o monopólio dos investimentos em infraestrutura e do mercado de gás natural no Brasil. A nova lei tenta ampliar o número de empresas atuando no setor. Uma das chaves para reduzir o preço do produto, no entendimento do governo, é mexer em atuais contratos de distribuidoras regionais que estariam em valores elevados e quebrar a atual lógica de transporte do produto.
A proposta determina que a atividade de transporte de gás natural será exercida sob o regime de autorização em lugar do regime atual, de concessão. No modelo de concessão, uma empresa interessada em investir em gasoduto precisa vencer um leilão da ANP. No regime de autorização, bastará apresentar o projeto e esperar o aval da agência. O modelo de autorização também será empregado para a atividade de estocagem subterrânea de gás natural.
Esse é um dos principais pontos de oposição das distribuidoras, que alegam que não existe interesse do governo em investir na expansão do uso de gás natural, o que ficaria claro em sucessivas ações da Petrobras e dos governos nos últimos anos.
As grandes produtoras não têm interesse em investir no escoamento do gás, e têm preferido, por exemplo, reinjetar o produto nos maiores campos do pré-sal. Vale mais a pena, pela lógica das produtoras, vender o óleo e reinjetar o gás.
Com isso, o Brasil segue importando gás natural. O Gasoduto Brasil-Bolívia já está saturado e não há interesse do governo e da Petrobras em novas rotas de gasodutos.
Para o setor das distribuidoras, uma Nova Lei do Gás que quisesse massificar o uso do gás natural e interiorizá-lo precisaria prever incentivos para investimentos em novos gasodutos, algo que vai na contramão da troca da concessão por autorização para o transporte, pois há muito risco envolvido para que haja interesse nesse tipo de investimento.
Pela proposta do governo, de acordo com o relator, será possível reduzir a intermediação de transportadoras e os grandes consumidores cuidarem diretamente do transporte do gás, barateando seu custo.
As distribuidoras defendem que o projeto a ser votado deveria prever grandes âncoras de consumo do gás, como termelétricas, para tornar o produto competitivo e interessante a investidores. A estimativa é de que o Brasil utilize hoje apenas pouco mais de 36% de seu volume de gás natural produzido. O resultado disso é que o país ainda importa boa parte do gás que consome, enquanto está reinjetando seu produto nos campos.
O desperdício dessa fonte de receitas, argumentam os distribuidores para tentar sensibilizar deputados a mudar o projeto, é que Estados e municípios perdem receita de royalties e de fundos como o FPE e o FPM.
Mas com a aliança de Guedes e Maia e das produtoras de óleo, além de vários setores da indústria que veem com bons olhos a ideia de desintermediação da distribuição, são grandes as chances de que a proposta seja aprovada como está.
O projeto é o mesmo aprovado pela Comissão de Minas e Energia no ano passado, do deputado Silas Câmara, e que, por sua vez, adota vários mecanismos do programa Gás para Crescer, do governo Temer.
Outro ponto da proposta que contraria os distribuidores é que os gasodutos poderão ser usados por todos os carregadores. É o chamado acesso a terceiros, que também será praticado nos gasodutos de escoamento da produção, nas instalações de tratamento ou processamento de gás natural e nos terminais de gás natural liquefeito.
A estratégia das empresas e associações de produtores tem sido evitar bombardear o projeto e dizer que ele precisa ser aperfeiçoado. A tentativa será incluir artigos na proposta que garantam investimentos e tentar conter a troca da concessão pela autorização.
“O texto atual do PL 6407/13 é tímido. O projeto de lei precisa ser mais assertivo, criando oportunidades para atrair investimentos privados em infraestrutura. Somente assim, garantindo um casamento entre demanda e oferta, é que será possível interiorizar e universalizar o acesso ao gás natural, que deve ser para todos. Não se pode desperdiçar o bilhete premiado disponível dos campos de gás do Pré-sal. É preciso que a Nova Lei do Gás seja aprimorada para que tenhamos de fato um novo mercado com novo gás”, disse ao BRP Augusto Salomon, presidente executivo da Abegás.
Já o governo tem sido mais incisivo na necessidade de aprovar a proposta como está. Guedes não costuma ser nada compreensivo com a situação dos atuais contratos de distribuição, que, no seu entendimento, só encarecem e impedem a ampliação do uso do gás natural.
Ele conseguiu sucesso na aprovação do regime de urgência, no último dia 29, outro indicativo favorável à votação nesta semana.
Fonte: BR Político
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