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Após tentativa de abertura do mercado de gás natural, preço subiu quase 50%, e domínio da Petrobras aumenta

A Nova Lei do Gás não reduziu o custo do insumo e nem a dominância da Petrobras. Estudo da consultoria Gas Energy estima que a estatal será responsável por cerca de 80% do volume novo de gás natural que deve entrar em produção até 2030, estimado em cerca de 55 milhões de metros cúbicos por dia. Embalada sobretudo pelo pré-sal e a perspectiva de uma rede de gasodutos na Bacia de Sergipe-Alagoas, a produção de gás no Brasil deve alcançar a faixa inédita dos 180 milhões de metros cúbicos diários em 2032, de acordo com a EPE. Atualmente, são 130 milhões de metros cúbicos diários, mas ao menos metade não é aproveitada e acaba reinjetada nos poços de petróleo no mar. Hoje, 65% da produção de gás natural do país vem da Petrobras. A estatal concentra ainda 85% de toda a matéria-prima comercializada para o segmento não-térmico (que exclui as usinas de geração de energia elétrica) no país, que inclui indústrias e refinarias.

O presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, afirmou recentemente que pretende investir mais na infraestrutura de escoamento para aproveitar melhor todo esse gás e usar o insumo na retomada da construção de fábricas de fertilizantes, suspensa em 2014. Essa perspectiva levou o governo a criar um grupo de trabalho para desenvolver um novo programa de incentivos ao gás no âmbito do CNPE.

“O novo marco do gás e a venda de ativos da Petrobras foram essenciais para se iniciar um ambiente de concorrência no segmento, mas a guerra na Ucrânia afetou os preços em todo o mundo. Agora, é preciso permitir o desenvolvimento da demanda para o uso desse gás no Brasil”, diz Rivaldo Moreira Neto, sócio da Gas Energy. “O maior desafio não é o escoamento desse gás. A questão é saber o que fazer com ele, criando política de consumo para o gás por parte da indústria, como siderurgia e fertilizante.

É necessário criar uma política específica de venda desse gás para esses setores com preços diferentes e condições específicas”. Para o consultor Pedro Rodrigues, sócio do CBIE, a possibilidade de a PPSA trocar óleo por gás pode estimular o mercado e a construção de gasodutos. “Quando se constrói uma infraestrutura é porque esse gás já está contratado. O Brasil está injetando (nos poços) um produto que vale mais que o petróleo hoje. Estamos na era de ouro do gás, o combustível da transição energética. Do ponto de vista econômico, é um contrassenso jogar fora esse gás”.

Entre as empresas privadas do setor, há expectativas sobre os planos do governo para o gás natural e os ajustes que a Petrobras está fazendo em seu plano de negócios 2023-2027, que prevê investimentos de US$ 5,2 bilhões em infraestrutura de gás.

A estatal continua o principal parâmetro para quem atua na área. Segundo um executivo de uma petroleira, há a indicação nos bastidores de que a estatal dê até maio sinais mais concretos sobre as fábricas de fertilizantes e a busca de parcerias para novos projetos de infraestrutura de gás. Erick Portela, CEO da NTS, que conta com mais de dois mil quilômetros de gasodutos comprados da Petrobras, ligando Rio, Minas e São Paulo, diz que a estatal ainda é a grande parceira das empresas do setor em novos investimentos ao manter participação relevante no mercado.

Ele vê uma demanda potencial no Sul e no Sudeste e não descarta atuar também nos dutos de escoamento no mar. “Estamos aqui para agregar valor a qualquer produtor e consumidor de gás. A Petrobras passa a ser um potencial grande parceiro. Somos uma plataforma de investimento. Se há espaço para trabalhar rotas submarinas, entramos. Nosso planejamento olha soluções estratégicas em mar”. A NTS também aguarda definições na estatal para iniciar a duplicação de um eixo de 300 quilômetros de gasodutos entre Rio e São Paulo, a fase 2 de um projeto que integra os planos de R$ 12 bilhões em investimentos da companhia.

A TAG, que também administra uma rede de gasodutos comprados da Petrobras, planeja investir até R$ 3,3 bilhões nos próximos cinco anos em ampliação e manutenção, dos quais 70% na Região Nordeste. Ovidio Quintana, diretor Comercial e Regulatório da empresa, também vê a Petrobras como um agente que continua relevante, mas ressalta que o transporte do gás de outras companhias já representa 23% da receita da TAG.

“A Petrobras vai continuar sendo um player relevante principalmente na agenda dos novos investimentos, mas estamos num momento em que a cooperação entre os elos da cadeia para fazer um planejamento coordenado é importante para ter um investimento eficiente para o usuário final. Vamos ter mais gás do pré-sal entrando no sistema. É como garantir que a oferta nova pode chegar ao mercado e coordenar os gatilhos de decisão de investimento”, afirma Quintana.

Ele também não descarta investir em novas rotas submarinas. E acrescenta: “O mercado está crescendo, e a oferta está mudando de lugar. Você tem que planejar a rede para garantir o atendimento. Se tiver sinergia com a TAG, a gente não descarta investir em novas rotas para promover a monetização do gás nacional. Vemos potencial em diversos setores, como a integração com o setor elétrico. Mas não basta ter gás se ele não estiver disponível. Nosso papel é que o gás esteja disponível para o maior número de clientes”.

Também no Nordeste, a estratégia da Origem Energia é criar centrais de estocagem de gás. Nathan Biddle, diretor técnico da empresa, lembra que já está em conversa com as produtoras, mas ainda depende do aval da ANP. O plano é reduzir os preços do mercado com ofertas mais flexíveis de venda do gás sem as exigências atuais de ‘take or pay’, quando uma empresa é obrigada a pagar mesmo que não consuma.

“O mercado precisa ser mais dinâmico e com mais operadores. Esse é o desafio atual do setor. Só assim o preço vai cair. A estocagem do gás vai poder atender a várias demandas diferentes”. No segmento de biometano, a intenção da Petrobras de produzir dois milhões de metros cúbicos do biogás por dia a partir de 2027 também é vista com atenção pelas outras empresas da área. Segundo Marcel Jorand, CEO da Gás Verde e sócio do Grupo Urca Energia, a estatal pode estimular ainda mais o desenvolvimento desse mercado.

“A companhia tem tamanho para induzir o crescimento. Estamos abertos ao diálogo. Hoje, o segmento de biometano produz 400 metros cúbicos por dia, e nós temos metade desse total. O Brasil tem potencial para produzir até 70 milhões de metros cúbicos por dia a partir de aterros, etanol e resíduos do agronegócio”. Jorand diz o Grupo Urca está investindo R$ 500 milhões neste ano na ampliação de uma planta de produção de biometano em Seropédica e na criação de unidades em Nova Iguaçu e São Gonçalo.

O executivo ressaltou os planos da companhia para estimular o uso desse combustível mais limpo para a indústria de veículos pesados, com a criação de postos de abastecimento. “Além disso, é importante definir o uso do gás no Brasil pelo sistema elétrico com térmicas na base. Isso tudo ajuda a viabilizar o consumo do gás. Não se pode esquecer ainda de criar o arcabouço legal para que as distribuidoras ofereçam tarifas competitivas para transportar o gás”.

Fonte: O Globo

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